Por Martha E. Corazza
O uso dos mecanismos de voto a distância em assembleias gerais de companhias abertas tende a crescer a partir de 2017 e a estimular novas alternativas de governança para os investimentos de renda variável dos fundos de pensão. A entrada em vigor, de modo integral, da Instrução 561 da Comissão de Valores Mobiliários, que terá sua etapa final de implementação em 2017, deve incentivar uma participação mais ativa dos investidores institucionais nas decisões das empresas em que investem.
Para as fundações, esse é um item que tende a ganhar ainda maior relevância à medida que os ativos de renda variável voltarem a crescer nas carteiras de ativos. Em boa parte das EFPC, as estruturas formadas por equipes internas enxutas, assim como as participações muitas vezes pequenas no capital das empresas não favorecem até agora o uso de tempo e recursos para analisar todas as questões a serem votadas nas assembleias gerais.
EFPC são sempre ouvidas - Diante dessas dificuldades, quando há carteiras terceirizadas uma das saídas tem sido utilizar os serviços dos gestores terceirizados como representantes das entidades nessas assembleias. “A participação dos fundos de pensão nas assembleias ainda é acanhada, à exceção de duas das maiores entidades do País as demais praticamente não participam e é raro encontrar quem fale por elas nas assembleias, ou seja, não cobram os gestores terceirizados para fazer isso”, analisa o especialista em governança corporativa Renato Chaves. A expectativa é de que o voto a distância ajude a estimular essa presença, acredita o especialista. Mesmo as fundações que tem pequenas posições acionárias nas empresas e aquelas que contam com equipes enxutas de profissionais devem fazer um esforço para estar presentes de algum modo nas discussões e votações, sublinha Chaves: “Eles são sempre ouvidos, os representantes das empresas sabem que por trás de um fundo de pensão, por menor que seja sua participação, há milhares de investidores, então há uma preocupação em ouvi-los”.
Estrutura atualizada - Em busca de um modelo mais eficiente nesse quesito, a Funcesp colocou o tema em pauta e prepara a adoção de um desenho inédito para ampliar sua presença nas assembleias. Como parte de um projeto de aprimoramento constante de governança de seus investimentos, a fundação, que é signatária do PRI (na sigla em inglês Principles for Responsible Investment ou Princípios para o Investimento Responsável), está montando uma estrutura mais atualizada às demandas locais e ao que acontece lá fora nesse aspecto. “O proxy voting (voto por procuração), um dos mecanismos de voto a distância, é considerado um ponto essencial dessa estratégia e, como investidor relevante, a Funcesp tem a responsabilidade de aperfeiçoar sua atuação”, observa o gerente executivo de Renda Variável da entidade, Paulo de Sá Pereira.
O desenho passa pela contratação de uma consultoria externa local que irá analisar previamente as assembleias e, por meio de um filtro, transmitirá à fundação as principais questões a serem votadas. “Esse é um passo importante na estratégia interna de governança, porque permitirá que as decisões estejam mais alinhadas com as características e demandas da própria fundação”, explica Pereira.
A ideia é muito interessante, aprova Renato Chaves: “Desse modo a fundação maximiza recursos porque não precisa usar o tempo de sua equipe permanente para esse trabalho, conta com opinião especializada e no futuro pode até compartilhar a experiência com outras fundações”. Além disso, reforça Chaves, o modelo tem a vantagem de garantir atuação direta junto às companhias, sem a intermediação dos gestores terceirizados. A Funcesp, com participações em aproximadamente 50 empresas, não votou nas assembleias na temporada 2016. “Havia um segmento de fundos de retorno absoluto, com três gestores terceirizados dos quais dois são mais ativistas e também passamos procuração, mas o nosso voto não teria alterado a decisão tomada”, detalha Pereira.
O poder de mudar - A partir da nova modelagem, a Funcesp terá um comando mais direto e melhor embasado de sua presença nas assembleias e dos seus votos. “A consultoria fará a pré-análise de cada assembleia e discutirá conosco as questões a serem votadas, nós decidiremos o voto e, num segundo movimento iremos avaliar se iremos às assembleias nós mesmos, se a consultoria irá nos representar ou se faremos o voto a distância”, diz Pereira. Com uma estrutura interna pequena, o proxy voting ajudará de duas formas: com a análise prévia, que garantirá maior sintonia, e resolvendo a questão da logística.
“Esse tipo de solução será cada vez mais importante, principalmente se levarmos em conta que as companhias estão passando por grandes mudanças e muitas delas já não têm um controlador único, o que torna a atividade dos acionistas mais decisiva e o voto a distância virá enriquecer esse processo todo”, pondera o gerente executivo. Ele lembra que, embora haja um atraso em relação ao que acontece em termos de governança de investimento em outros países, na correlação com o mercado interno a estrutura de governança dos fundos de pensão brasileiros mostra um saldo positivo. A decisão sobre os mecanismos a serem utilizados ainda deverá passar por uma curva de aprendizagem, acredita Pereira, com a maioria preferindo o voto por procuração: “De todo modo, o voto a distância trará a cultura de votar em assembleia, o que irá melhorar o aprendizado dos investidores”. Renato Chaves concorda: “Os fundos de pensão precisam agir para melhorar a governança das companhias, eles tem esse poder e, como a tendência é de que um dia o juro volte a cair, as participações em empresas ganharão mais espaço”, alerta o especialista.
Fonte: Diário dos Fundos de Pensão, em 05.07.2016.