Por Luciene Magalhães (*)
Em resposta aos eventos climáticos drásticos enfrentados por todos os continentes, uma onda de iniciativas globais multilaterais visa melhorar a resistência do mundo aos desastres. Agora é o momento das seguradoras colaborarem com parceiros públicos, privados e ONGs para enfrentar um problema premente que é muito relevante para todas as comunidades e para a sustentabilidade do setor.
Os resultados destrutivos das mudanças climáticas têm um enorme custo humano e econômico, de acordo com a Munich Re, que observou que os países de baixa e média renda são desproporcionalmente afetados, representando 85 por cento das mortes por desastres naturais. Ela também estimou que os prejuízos relacionados ao clima global aumentaram quatro vezes, de uma média de US$ 50 bilhões por ano na década de 1980 para cerca de US$ 200 bilhões por ano na última década.
Felizmente, os líderes mundiais estão despertando para esse problema. Em um nível mais amplo, um sucessor para os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio da ONU será concluído até 2015, visando orientar os planos nacionais para a erradicação da pobreza, responder às mudanças climáticas e fortalecer a resiliência.
Em paralelo, 160 países se reunirão no Japão em 2015 para chegar a acordo sobre um sucessor para o Marco de Ação de Hyogo (HFA – Hyogo Framework for Action) de 10 anos, assinado em 2005 para aumentar a resistência das nações aos desastres. Alinhado com os novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, o HFA2 fornecerá orientação para ajudar a prevenir a criação de novos riscos, reduzir o risco existente abordando a exposição e vulnerabilidade, e fortalecer a resiliência por meio de medidas sociais e econômicas – incluindo o financiamento e seguros contra riscos de desastres.
Agora é o momento do setor privado participar da conversa. Nossa equipe de cidadania corporativa global focou o desenvolvimento sustentável e redução de riscos, fornecendo liderança e análise das questões e coordenando a resposta global da KPMG ao desenvolvimento econômico inclusivo e desastres naturais. Mais recentemente, a equipe trabalhou com a Oxfam para compartilhar a especialização das firmas-membro visando aumentar a resistência de comunidades propensas a desastres nas Filipinas.
O papel das seguradoras torna-se claro
O papel das seguradoras é amplo, apontando primeiramente para a Iniciativa Financeira do Programa Ambiental das Nações Unidas, os Princípios para o Seguro Sustentável. Esses quatro princípios, lançados em junho de 2012, descrevem como o setor de seguros pode incorporar as questões ambientais, sociais e de governança na tomada de decisões, trabalhar com parceiros para gerenciar o risco e desenvolver soluções de uma forma responsável e transparente.
O mundo está olhando para o setor de seguros como uma fonte de capital paciente para financiar projetos de infraestrutura resiliente, como uma fonte de dados de risco e especialização na gestão de riscos para fortalecer a capacidade do governo, e como um fornecedor de soluções de transferência de riscos para considerar a mentalidade de redução de risco de desastres e resiliência nas suas estratégias e estruturas de gestão de riscos.
E agora é um momento realmente interessante para as seguradoras se envolverem, à luz das mudanças tecnológicas que tornam muitas coisas possíveis a um preço acessível, observando como a detecção remota, análise de dados e computação em nuvem possibilitam uma modelagem de riscos, previsão do tempo e avaliação de danos avançadas, enquanto os telefones celulares e mobile money ampliam o alcance do microseguro para comunidades remotas.
Diversas seguradoras colaboraram recentemente com modelos de código aberto, por exemplo, desenvolvendo o Modelo de Terremotos Globais e Visualizador de Dados de Riscos Globais, lideradas pelo Escritório das Nações Unidas para a Redução de Risco de Desastres. Enquanto isso, o Zurich Insurance Group e sua Fundação Zurich diferenciaram-se em 2013 ao renovar uma parceria de cinco anos e US$ 23 milhões com a Federação Internacional da Cruz Vermelha para estabelecer um programa de resistência a inundações de comunidades, com o México sendo o primeiro de vários países a incluir projetos comunitários e modelagem de riscos de inundação sofisticada.
As seguradoras têm uma enorme influência, seja como fornecedoras de macro, meso e micro soluções de transferência de riscos, ou ao precificar com precisão o risco, o que norteia as empresas e governos a tomar decisões de investimento apropriadas.
Elas podem investir em adaptação climática, como projetos de energia renovável e compartilhar sua especialização em gestão de riscos para desenvolver as capacidades dos governos de gerir riscos complexos inter-relacionados no âmbito nacional. Todos esses esforços podem nos ajudar a reduzir, gerenciar e subscrever melhor os riscos, e manter o setor de seguros relevante para o futuro.
Uma vez que o setor privado representa cerca de 85 por cento do investimento global, as decisões tomadas hoje nos afetarão por décadas. Devemos acelerar a reflexão sobre como tornarmos o investimento de negócios mais resistente e como podemos trabalhar juntos, incluindo seguradoras, o setor privado mais amplo, governos e a sociedade civil, uma vez que nenhum de nós pode enfrentar o desafio individualmente.
(*) Luciene Magalhães é sócia líder da prática de seguros da KPMG no Brasil.
Fonte: Artigo publicado originalmente na revista Opinião.Seg, Edição nº 8 - Agosto de 2014 - páginas 19 e 20.