Por Márcia Alves
A redução de renda e o desemprego têm levado os brasileiros a abandonarem seus planos de saúde. De acordo com a Agência de Saúde Suplementar (ANS), quase meio milhão de beneficiários cancelaram seus planos em 2015 e, neste ano, mais de 160 mil pessoas. A retração no número de beneficiários foi de 0,3% no período de setembro de 2014 a setembro de 2015, liderada pelos planos empresariais. O diretor-executivo da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), José Cechin, avalia que a perda não foi muito grande se comparada aos números do desemprego e da redução de renda. “Isso mostra que o setor de saúde suplementar é resiliente”, diz.
Mas, mesmo diante da crise econômica, a classe média tem priorizado a manutenção do plano de saúde. Uma pesquisa da consultoria Plano CDE, realizada no ano passado, apontou que na lista cortes da classe C, os itens que menos sofreram redução foram estudo próprio (11%) e plano de saúde (11%). Na avaliação de Cechin, este é um dado positivo para o setor. “As pessoas adaptam outros tipos de despesas e fazem economia de diversas ordens na tentativa de manter o plano de saúde”, comenta. Para ele, a retração no setor não define o futuro. “Os planos de saúde estão sendo afetados pela crise, mas, apesar da queda no número de beneficiários, o setor continua”, diz.
Para o diretor da FenaSaúde, o momento é de controlar os custos e despesas. “É necessário que haja uma regulação adequada e que se olhe sempre para os propulsores dos custos, tentando atuar neles para que as despesas não cresçam”, diz. Considerando que não é possível alterar a formatação dos planos para se adequar à nova realidade econômica, já que as coberturas são definidas pela ANS, ele entende que há outros meios de conter custos. “O que se espera é que a agência, sabedora da tendência dos problemas atuais, examine dupla e triplamente qualquer proposta de resolução, particularmente aquela que impacte nos custos, exatamente para não compor mais dificuldade num cenário que não é catastrófico, mas também não é brilhante”, afirma.
Desoneração do SUS
A redução no número de beneficiários expôs, por outro lado, a importância da saúde suplementar na desoneração do SUS. Segundo o DataSUS (banco de dados do Ministério da Saúde), a produção hospitalar do SUS subiu de 107.907 internações entre janeiro e outubro de 2014 para 108.402 no mesmo período de 2015. Significa que os brasileiros que perderam seus planos estão migrando para SUS e, com isso, aumentando as despesas do governo.
Essa migração provocou a reação de vários governadores de estados. Em reunião no final do ano passado com o ministro da Saúde, eles reivindicaram que a cobrança aos planos de saúde por usuários que são atendidos pelo Sistema SUS seja feita pelos estados e municípios. Atualmente, a cobrança é feita pelo governo federal. “Com essa crise, as pessoas estão com dificuldade de pagar seus planos de saúde e cada vez mais se socorrem na rede pública. Isso está sobrecarregando muito”, disse o governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, durante a reunião.
Para o professor da Faculdade de Medicina da USP e vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Mário Scheffer, “os governadores quiseram tirar um coelho da cartola, mas a proposta é incipiente e não irá solucionar o subfinanciamento da saúde”. Ele destaca, ainda, que a proposta provocaria uma distribuição desigual dos recursos, uma vez que os usuários de planos de saúde estão concentrados em alguns estados. Segundo ele, de 2008 a 2012, somente São Paulo representou 44% em relação ao total de internações notificadas para ressarcimento.
Cechin analisa que essa situação comprova que a saúde suplementar desonera e SUS. “Sempre se ouviu da imprensa, dos meios de comunicação e do setor publico, que o setor suplementar não desonera o SUS. Mas, agora, o discurso é, exatamente, que, a diminuição de beneficiários de planos de saúde está sobrecarregando o SUS. Isso é o reconhecimento da importância que o setor tem”, diz.
Em nota, a FenaSaúde reforçou a tese. “Cabe ressaltar que a alegação de que os beneficiários de planos de saúde sobrecarregam a rede pública é uma descrição completamente invertida dos fatos, já que é obrigação do poder público oferecer atendimento integral e com acesso universal. Antes de serem beneficiários de planos de saúde, brasileiros que contratam a saúde privada também são cidadãos e podem optar pelo meio de atendimento à saúde que lhes for mais conveniente. Esse é um direito constitucional”.
Fonte: CVG-SP, em 28.02.2016.