A Lei 15.040/2024 (“Lei de Contrato de Seguro”, ou “LCS”) disciplina o agravamento do risco nos arts. 13 e seguintes. A respeito dessa figura, estabelece dois deveres do segurado: primeiro, no art. 13, o dever de abster-se de agravar o risco; segundo, no art. 14, o dever de comunicar o agravamento do risco de que tome conhecimento.
Ambos esses deveres encontram antecedente nos arts. 768 e 769 do Código Civil – em vigor até 10.12.2025. O CC não definia os contornos do agravamento, mas a doutrina esclarecia que a conduta sancionada era aumentar “de forma intencional, relevante e duradoura, a probabilidade de lesão ao interesse garantido, ou a severidade dessa lesão.”¹
Com o novo diploma legal prestes a entrar em vigor, avanços trilhados na doutrina e jurisprudência agora estão positivados (arts. 13 a 17), a iniciar pela própria definição do agravamento do risco relevante.
A eliminar qualquer dúvida, a Lei deixa claro que o agravamento juridicamente relevante deve ser "significativo e continuado” e incrementar a “probabilidade de realização do risco descrito no questionário de avaliação de risco" (art. 13, § 1°, LCS), além de ser intencional (art. 13, caput, LCS).
Em adição, a LCS prevê que para recusar-se a pagar a indenização decorrente de determinado sinistro por esse fundamento, a seguradora deve comprovar o nexo causal entre esses dois eventos (art. 16).
Uma vez que a seguradora seja comunicada sobre um agravamento relevante do risco, as consequências disponíveis são diferentes conforme a espécie de seguro. Nos seguros de dano, a seguradora deve, em até 20 dias, cobrar a diferença de prêmio ou, se não for tecnicamente possível garantir o novo risco, resolver o contrato – hipótese em que a vigência se encerrará 30 dias depois do recebimento da comunicação da resolução pelo segurado (art. 14, §1º). Já nos seguros de vida e integridade física, conforme o art. 17, a seguradora somente poderá cobrar a diferença de prêmio. Em qualquer caso, se o aumento de prêmio for superior a 10%, o segurado poderá resolver o contrato em até 15 dias contados da ciência dessa alteração (art. 15).
¹ TZIRULNIK, Ernesto; CAVALCANTI, Flávio de Queiroz B. & PIMENTEL, Ayrton. O contrato de seguro de acordo com o Código Civil brasileiro. 3. ed., São Paulo: Roncarati, 2016, p. 122.
Jurisprudência
REsp nº 2154565/SC. A 3ª Turma foi provocada a decidir sobre a validade de excludente de cobertura diante de um sinistro de morte acidental por acidente pessoal, no qual o segurado havia dirigido sob efeito de drogas. No julgado, reiterou o entendimento do STJ que “distingue as hipóteses de seguro de coisas, em que o agravamento do risco pode ensejar perda da cobertura, daquelas atinentes ao seguro de pessoas, nas quais o risco é permanente e inerente ao próprio objeto contratado”. Por isso, considerou abusiva a cláusula que exclui cobertura por uso de substâncias entorpecentes, aplicando a Súmula 620/STJ², de modo a condenar a seguradora ao pagamento do capital segurado. O julgado mencionou entre seus fundamentos, ademais, a função social do contrato de seguro de pessoas e a legítima expectativa dos beneficiários.
A decisão ecoa os arts. 13, § 1°, e 17 da nova Lei de Contrato de Seguro, que estabelece que o agravamento relevante do risco exige incremento continuado, e não pontual, da probabilidade de sinistro; sendo certo que essa figura, no seguro sobre a vida e integridade física, não conduz à perda da garantia, mas apenas à cobrança da diferença de prêmio.
AREsp nº 2362933/SP. A 3ª Turma foi provocada a se manifestar sobre as normas aplicáveis à pretensão da seguradora sub-rogada em caso no qual a obrigação de indenizar estava sujeita a regras de direito internacional – em particular, as Convenções de Varsóvia e de Montreal (Decreto nº 5.910/2006) no transporte aéreo internacional de carga, que preveem limitação de responsabilidade do transportador. No caso, a seguradora ajuizou ação regressiva contra a transportadora, a fim de obter o valor pago em razão de extravio e avarias em cargas transportadas por meio aéreo internacional. Ao analisar a questão, o STJ decidiu que, de acordo com o art. 786, CC, “à seguradora sub-rogada devem ser aplicadas todas as limitações que incidiriam no segurado em decorrência dos prejuízos causados pela transportadora”. Desse modo, a limitação de responsabilidade aplicável na relação entre segurado e transportadora de cargas (Tema 210/STF³) é oponível também à seguradora.
² Súmula 620/STJ: "a embriaguez do segurado não exime a seguradora do pagamento da indenização prevista em contrato de seguro de vida”.
³ Tema 210/STF: “Nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor. O presente entendimento não se aplica às hipóteses de danos extrapatrimoniais”.
Regulação
Consulta Pública: Foi submetida a consulta pública a Minuta de Resolução SUSEP sobre transferência de carteira integral ou parcial entre as sociedades seguradoras, as sociedades de capitalização, as sociedades cooperativas de seguros, as entidades abertas de previdência complementar e os resseguradores locais. O prazo para contribuições é 13.11.2025.
Instituto Brasileiro de Direito do Seguro
Documentário: Uma Lei para Todos. O IBDS realizou um documentário sobre o processo de elaboração e tramitação da Lei do Contrato de Seguro, dirigido por Rodrigo Siqueira, que pode ser encontrado neste link.
X Congresso Internacional do IBDS. Entre 16 e 18 de outubro, aconteceu o X Congresso Internacional | X Fórum José Sollero Filho do IBDS. O encontro contou com a participação de autoridades públicas, juristas brasileiros e estrangeiros, e profissionais experientes do mercado de seguros.
Na abertura, Ernesto Tzirulnik, José Eduardo Cardozo e Alessandro Octaviani destacaram o processo legislativo e os debates que resultaram na nova Lei de Contrato de Seguro; além disso, homenageou-se a Professora Judith Martins-Costa, por sua valiosa contribuição ao direito civil e à reflexão sobre o projeto de lei que se tornará em breve direito em vigor. As doze mesas abordaram grande parte das alterações legislativas, com agudas discussões sobre a interpretação da nova disciplina e seus impactos para a prática securitária no Brasil. Por fim, o encerramento teve lugar no Theatro Municipal e foi aberto ao público. Nessa ocasião, foi exibido o documentário “Uma Lei para Todos”; fez-se uma linda homenagem ao fotógrafo Sebastião Salgado; o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, proferiu discurso em que tratou do avanço representado pela nova Lei do Contrato de Seguro; e, ao final, o público desfrutou de uma apresentação especial de Paulinho da Viola.
As filmagens dos painéis e demais eventos serão disponibilizados em breve no site do IBDS.
Fonte: ETAD, em 31.10.2025