Foi publicada no Diário Oficial da União de hoje, dia 12/02, a Mensagem Presidencial nº 36/2015 que encaminhou o texto do Intergovernmental Agreement (IGA) para a apreciação do Congresso Nacional. O IGA é o instrumento jurídico que viabilizará a implementação do FATCA no Brasil.
Em 18 de março de 2010, o Congresso dos Estados Unidos da América (EUA) aprovou o Foreign Account Tax Compliance Act (FATCA) lei federal que possui implicações de caráter extraterritorial e que pretende gerar efeitos em todos os países do mundo. Em vigor desde 1º de janeiro de 2013, seu objetivo é “detectar, deter e desencorajar a evasão fiscal” de norte-americanos por meio de instituições financeiras e não financeiras fora dos EUA, incluindo aquelas em funcionamento no Brasil.
Segundo o Itamaraty, 44 países já assinaram acordos com os EUA semelhantes ao que foi assinado pelo Brasil. Outros 58 rubricaram o texto final e assinarão acordos até dezembro de 2014, data limite para que as instituições financeiras desses países não sejam afetadas pelas multas previstas no FATCA.
Destaques do FATCA
A definição do que é instituição financeira é ampla e engloba: entidades que se dediquem ao investimento no mercado de títulos e valores mobiliários, a atividades bancárias em geral, ou à custódia, intermediação, corretagem e detenção de investimentos em favor de outros, incluindo fundos de investimento, seguradoras, empresas de previdência, de capitalização e cooperativas bancárias. De acordo com a lei, todos os produtos financeiros que possibilitem acumulação são passíveis de reportes pelas instituições financeiras aos norte-americanos. (grifos da Editora Roncarati).
A lei do FATCA se aplica às chamadas US persons, isto é, pessoas com nacionalidade norte-americana, nascidas nos EUA ou com pais norte-americanos, pessoas com visto de permanência nos EUA (green card), ou residentes nos EUA, independentemente de serem residentes fiscais ou de terem também nacionalidade em outro país. De acordo com essa lei, quando os US persons detiverem mais de 10% de participação direta ou indireta no capital ou lucro de quaisquer empresas, inclusive brasileiras, tais empresas serão consideradas US persons, independentemente de serem constituídas ou residentes fiscais em seus países de origem.
Os impactos dessa legislação para o Brasil são, de acordo com o capítulo 4 do Código Tributário dos EUA, onde o FATCA está incluído, que todas as instituições financeiras que operam no Brasil identifiquem os US persons em sua base de clientes para que suas informações sejam repassadas às autoridades competentes nos EUA. O prazo para diligenciar todas as contas de pessoas físicas era até junho de 2014 e para as contas de pessoas jurídicas até dezembro de 2014.
Esses prazos para a realização da due diligence foram estabelecidos porque até o dia 30 de junho de 2015 todos os dados de clientes com saldo superior a US$ 1 milhão deverão ser reportados ao Internal Revenue Service (IRS), a Receita Federal norte-americana. Até o dia 30 de junho de 2016, todas as demais contas antigas, independente do saldo, deverão ser reportadas ao IRS para que, a partir de 1º de janeiro de 2017 todas as contas, novas e antigas, juntamente com as suas informações, passem a ser reportadas periodicamente.
Os governos do Brasil e dos EUA assinaram o IGA que normatizou o processo de envio de informações de modo recíproco e sanou a questão do sigilo bancário (troca de informações entre países e não entre uma instituição financeira e o governo norte-americano), da retenção (eliminou a figura do cliente “recalcitrante”, já que todas as informações tornaram-se passíveis de reporte, via Receita Federal do Brasil) e a questão jurídica discriminatória (o FATCA previa a escolha dos clientes US persons e o reporte de suas informações). Há dois modelos de IGA sendo assinados entre os EUA e diversos países. A diferença dos dois modelos é somente a reciprocidade da troca de informações entre as partes. O modelo de nº 1, assinado pelo Brasil, prevê a reciprocidade, enquanto que países como Áustria, Japão, Suíça e Chile assinaram o de número 2.
O FATCA possui um fluxo de implementação que se finaliza no reporte das informações. São cinco etapas nomeadas por Due Diligence nas Contas Antigas, Registro das US persons, Cadastro de Novos Clientes, Reporte das Informações e Retenção dos Recursos. De maneira geral, a aprovação do Tax Information Exchange Agreements (TIEA), em 2007, dá substância e atribui uma previsão ao IGA por meio da autorização da troca de informações para fins tributários, inclusive de modo automático.
Caso algum banco brasileiro se recuse a adotar as medidas de identificação das US persons poderá sofrer severas restrições. A instituição financeira ficaria sujeita à retenção na fonte de imposto de renda nos EUA à razão de 30% sobre quaisquer rendimentos, ganhos ou proventos brutos da venda ou liquidação de ativos capazes de gerar juros e dividendos de fontes norte-americanas.
Também teria grande dificuldade para participar do mercado financeiro nacional e internacional, já que muitas instituições financeiras norte-americanas ou estrangeiras podem deixar de negociar contratos ou ainda podem aumentar custos e taxas de contratação, dadas as obrigações inerentes ao FATCA. Ademais, uma instituição financeira brasileira não poderia ter, em seu grupo econômico, empresas que sejam instituição financeira participante do FATCA como controladoras, coligadas, afiliadas, controladas e subsidiárias. Isso significa que uma instituição brasileira não aderente ao FATCA será não participante em qualquer lugar do mundo. Assim, os custos financeiros e a perda de competitividade de uma instituição financeira não participante afetariam todo o seu grupo econômico financeiro. Como os EUA são o maior mercado financeiro do mundo, a legislação significa, na prática, que todos os bancos brasileiros precisam aderir ao FATCA.
Pontos do IGA
A questão do sigilo bancário foi tratada no artigo 4º, §1, alínea a que diz: “...a própria Instituição Financeira Brasileira Informante: a) identificar Contas a Serem Informadas e repassar anualmente à Autoridade Competente Brasileira as informações que devem ser prestadas, como exigido no subparágrafo 2(a) do artigo 2º do presente Acordo, no prazo e em conformidade com o descrito no artigo 3º deste Acordo;”
No que se refere à retenção de impostos de clientes recalcitrantes o artigo 4º, §2 afirma que “Os Estados Unidos não deverão exigir que Instituição Financeira Brasileira Informante retenha impostos nos termos das seções 1471 e 1472 do Código da Receita Federal dos EUA em relação a conta mantida por titular recalcitrante (definida na seção 1471 (d) (6) do Código da Receita Federal dos EUA) ou que feche a referida conta, se a Autoridade Competente dos EUA receber a informação descrita no subparágrafo 2(a) do artigo 2º do presente Acordo, sem prejuízo do disposto no artigo 3º deste Acordo, com relação a essa conta.”
Convenção sobre Assistência Mútua Administrativa em Matéria Fiscal
Conforme dispõe a Exposição de Motivos da mensagem encaminhada pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional, no âmbito do G20, além da Convenção sobre Assistência Mútua Administrativa em Matéria Fiscal – já assinada pelo Brasil e sob análise do Congresso – a adoção de um novo arcabouço para a troca automática de informações reforçará as medidas de combate à fraude e à evasão, assim como na redução do espaço para a prática de elisão fiscal, respeitadas as regras de sigilo pelos agentes tributários. Tais práticas são especialmente relevantes no atual contexto internacional que busca maior transparência tributária, maior cooperação entre as administrações tributárias e combate ao planejamento tributário abusivo, considerado pelo G20 como um dos agravantes da crise financeira global pelo efeito de erosão da base tributária dos países e seu impacto nos orçamentos nacionais. Neste sentido, a comunidade internacional já assumiu compromissos de estender o intercâmbio de informações no âmbito do FATCA com base em uma convenção multilateral
Tramitação da matéria
A Mensagem nº 36/2015, com Exposição de Motivos, assinada pelos Ministérios das Relações Exteriores (MRE) e da Fazenda (MF), foi recebida hoje pela Câmara dos Deputados.
A proposta ainda não recebeu despacho da Secretaria-Geral da Mesa, contudo, tendo em vista o conteúdo, provavelmente serão ouvidas as Comissões de Relações Exteriores e de Defesa Nacional (CREDN); de Finanças e Tributação (CFT) e de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC). Em seguida, a matéria deverá ser apreciada pelo Plenário. Se aprovada, ela será enviada para a deliberação do Senado Federal.
Fonte: CNF, em 12.02.2015.