Debate no XIII Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor elenca propostas para o fortalecimento
O mercado de Saúde Suplementar brasileiro enfrenta uma grave crise, impactado, tanto pela atual situação econômica que País atravessa, que reduz o poder de compra dos brasileiros, como devido a uma série de fatores que afetam particularmente esse sistema. Sistema sensível por lidar com consumidores que, por definição, já são vulneráveis e, neste caso, quando doentes, mais vulneráveis ainda.
Para debater o tema, reuniram-se em Foz do Iguaçu, em 2 de maio, durante o XIII Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor, a presidente da FenaSaúde, Solange Beatriz Palheiro Mendes; o diretor da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abrange), Pedro Ramos; a professora de direito e diretora do Brasilcon, Maria Stella Gregori; o também professor de direito e diretor do Brasilcon, Cristiano Heineck Schimitt; e o procurador de Justiça do MP-MG, diretor do Brasilcon, e mediador dos debates, Antonio Joaquim Schellenberger, durante o painel “Planos de Saúde e os Direitos do Consumidor”.

A presidente da FenaSaúde, Solange Beatriz Palheiro Mendes; o diretor da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abrange), Pedro Ramos; a professora de direito e diretora do Brasilcon, Maria Stella Gregori; o também professor de direito e diretor do Brasilcon, Cristiano Heineck Schimitt; e o procurador de Justiça do MP-MG, diretor do Brasilcon, e mediador dos debates, Antonio Joaquim Schellenberger
Mas, apesar dessa crise atual, são inegáveis, como bem lembrou Maria Stella Gregori, os avanços da saúde no Brasil nas últimas décadas, impulsionados pela Constituição Cidadã, de 1988, pelo Código de Defesa do Consumidor, de 1990, e pela Lei dos Planos de Saúde, de 1998, entre outros fatores. Durante esse período, os consumidores muito se empoderaram, tanto pelas normas mais favoráveis, quanto pelo aumento da conscientização desse poder, como pela maior possibilidade de acesso à informação, entre outras razões.
Entretanto, pela primeira vez desde o início da regulação da Saúde Suplementar, há quase 20 anos, o setor assiste a uma redução do número de beneficiários que, de acordo com dados oficiais divulgados nesta segunda-feira, já chega a 1,8 milhão. Beneficiários, em sua maioria, jovens, que, com sua ausência, fazem aumentar o valor médio dos planos, já que eles geram menos despesas assistenciais que os mais idosos. Também, pela primeira vez, as despesas totais são maiores que as receitas, resultando em um déficit de R$ 400 milhões.
Outro dado preocupante, apresentado por Solange Beatriz, foi que, de 2007 para cá, enquanto a inflação registrada pelo IPCA foi de 64,5%, os reajustes concedidos pela ANS aos planos individuais foram de 89,7%, e os custos das despesas assistenciais subiram 131,4%. Entre as razões para essa escalada dos custos está também a incorporação acrítica de novas tecnologias aos tratamentos, tecnologias, muitas vezes, sem eficácia comprovada e que não substituem as anteriores, mas somam-se a elas. Muitos procedimentos, geralmente caros, são também realizados em excesso, em proporções que ultrapassam em muito os da média de países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico- OCDE. Excessos ora incentivados por médicos, cujo modelo de remuneração não considera a efetividade dos tratamentos; ora pelos prestadores, que ganham por número de procedimentos; e ora pelos próprios consumidores, que, eventual e equivocadamente, sentem-se mais seguros com mais exames.
A judicialização da saúde também é outro grave problema que afeta o setor, por exigir das operadoras acesso a tratamentos não previstos em contrato e na regulação. Judicialização que, como lembrou Maria Stella, é elitista, pois beneficia os com mais condições de recorrer à Justiça, mas, como pontuou a presidente da FenaSaúde, também uma escolha muitas vezes injusta, pois, quando um juiz ou juíza autoriza, por exemplo, que um paciente tenha acesso a um tratamento muito caro não previsto, ele está, consequentemente, tirando recursos que poderiam ser utilizados por muitos outros pacientes ao mesmo tempo. Judicialização que, segundo Cristiano Heineck Schimitt, foi também incentivada pela expectativa gerada pelo Código de Defesa dos Consumidores, de que a Justiça era o caminho majoritário para que os consumidores alcançassem seus direitos. Judicialização que foi bastante discutida em outro evento sobre consumidores realizado na última sexta-feira, 29, em Porto Alegre. Clique aqui para ver a nota.
Outro grave problema enfrentado pelo setor: os custos exorbitantes de órteses e próteses. Materiais que, de acordo com Solange Beatriz, podem sair do fornecedor por US$ 2 mil e chegar aos planos de saúde por US$ 30 mil. Situação que, nas palavras proferidas por Pedro Ramos, presidente da Abrange, é “vergonhosa, escandalosa e inescrupulosa”.
E em face de essa gravíssima situação em que a Saúde Suplementar se encontra, Solange adverte: “Se continuarmos nesse caminho, em 10 anos, não haverá mais planos de saúde. E não falo isso como representante de uma classe, mas como beneficiária, como somos todos nós, pois antes de as operadoras quebrarem, elas deixam o negócio”. Não coincidentemente, disse o mesmo Pedro Ramos, o outro representante das empresas do setor: “A questão da saúde precisa ser colocada à luz da realidade dos fatos ou nossas empresas deixarão de existir em mais 10 anos”.
Mas quais poderiam ser os caminhos para superar essa crise? Além de todos os pontos já colocados, como mudanças na legislação, mais cuidado na incorporação de novos tratamentos, combate à máfia das próteses, racionalização do uso do sistema, alteração do modelo de remuneração médica e redução da judicialização, também foi citado o investimento em programas de promoção da saúde e prevenção de doenças e o combate ao desperdício e às fraudes. Mas pairando acima de tudo isso, está a necessidade de estabelecer um pacto de combate aos problemas entre todos os atores do setor – operadoras, corretores, reguladores, prestadores e, sobretudo, consumidores. “Não vejo como avançar em uma agenda positiva sem que o consumidor tome parte ativa dessa discussão”, disse Solange. Consumidor que, no entendimento da executiva, precisa ser um aliado na defesa desse sistema de Saúde Suplementar que atualmente beneficia quase 50 milhões de brasileiros, aliviando um sistema público muito deficiente, que já atende com dificuldade os 75% de brasileiros sem planos de saúde e atenderia ainda muito pior se tivesse que atender 100%. Sistema de Saúde Suplementar cuja quebra não interessa a ninguém, afinal, como já dito por Solange Beatriz, “somos todos beneficiários”.
Fonte: CNseg, em 03.05.2016.