O 21º Encontro de Líderes do Mercado Segurador reuniu executivos, especialistas e autoridades, com o propósito de refletir sobre perspectivas, desafios e oportunidades para os mercados de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização
Os desafios trazidos pelos avanços tecnológicos, a necessidade de inovação em produtos e serviços adequados às necessidades atuais dos consumidores, o surgimento das novas epidemias e os avanços nas questões regulatórias diante do atual cenário social, político e econômico do país estiveram entre os principais temas debatidos durante o 21º. Encontro de Líderes do Mercado Segurador, realizado na Praia do Forte, na Bahia, nos últimos dias 25, 26 e 27 de fevereiro. Para o presidente da Confederação Nacional de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNseg), Marcio Coriolano, o objetivo do evento foi propor, não somente reflexões, mas também ações efetivas voltadas para a manutenção do desenvolvimento sustentado do setor nas próximas décadas.
No primeiro dia de evento, durante o painel "O horizonte do Brasil no Século XXI”, a jornalista Miriam Leitão enfatizou que, diante de tanta imprevisibilidade nas rápidas mudanças do século 21, o momento é adequado para falarmos do futuro. Para ela, esta é a hora de pensar no futuro. “Quanto mais rápido soubermos para onde vamos, mais rápido chegaremos lá. Pensar no futuro nos faz avaliar riscos e isso reduz as chances de fracasso e aumenta as chances de permanecer no sucesso”, afirmou. Segundo ela, o Brasil está prisioneiro do imediato. O presente virou um redemoinho que suga e o impede de crescer, avaliou. Entre as mudanças do século 21, Miriam destaca o perfil demográfico, o clima, que traz muitas catástrofes, e a tecnologia. “São temas que todos devem pensar, principalmente vocês que fazem parte do mercado segurador”, sugeriu. A palestrante destacou que toda e qualquer crise terá uma saída democrática, em razão de tudo que já foi construído. O Brasil acertou muito ao longo das décadas, sempre construindo consensos. Uma luta de duas décadas, com a conquista da democracia em 1985, a estabilização do real em 1994 e, em 2004, com a inclusão social.”, diz. “Democracia, estabilidade e inclusão. Foi isso que escolhemos e construímos. Agora, estamos em busca do quarto consenso, mesmo no meio desta confusão que nos machuca e dói, mas que é parte da reconstrução”, comentou.
Já o painel “Inovação - Uma Perspectiva para o Mercado” abordou as influências das transformações tecnológicas no cotidiano do mercado segurador, sobretudo em relação à maneira como as empresas se relacionam com o consumidor. A vice-presidente do instituto americano de pesquisa Gartner, Belkis Toledo, afirmou que, para continuarem relevantes, as seguradoras precisam “quebrar os modelos tradicionais de negócio”, contando com líderes que enxerguem a necessidade de mudança e estejam preparados e dispostos a isso. Mesmo porque, se não o fizerem, outros o farão, como se evidencia ao observar os US$ 2,1 bilhões já investidos em startups de tecnologia da área de seguros. Também integrante do painel, o advogado e jornalista, Ronaldo Lemos, lembrou que quando a internet surgiu, servia para conectar computadores. Posteriormente, passou a conectar pessoas, como nas redes sociais. Agora, entramos na era da internet das coisas, ou seja, da conexão de todo e qualquer objeto utilizado pelo homem. O mercado de seguros, a seu ver, precisa levar em consideração esse mudança de cenário para saber aproveitar bem as oportunidades trazidas pelas novas tecnologias.
A última palestra do dia, proferida pelo presidente da Sensedia, Kleber Bacilli, e mediada por Alexandre Leal, superintendente Executivo Técnico da CNseg, tratou sobre “Ecossistemas Digitais” e os impactos que as novas tecnologias têm nas empresas de todos os ramos, mesmo as maiores e mais ricas. No mundo das instituições financeiras, por exemplo, observou Kleber, o que se vê é que estão sendo desafiados por pequenas startups desconhecidas que se tornam gigantes com o desenvolvimento de aplicativo que faça parte da “jornada digital da sociedade”. Para se manterem relevantes, as empresas precisam ser mais ágeis e possuir um sistema de governança mais simplificado para lidar com projetos inovadores. “É preciso ser diferenciado e fazer a oferta no local certo, na hora certa e de forma totalmente personalizada”, concluiu Bacilli.
No segundo dia de palestras, o painel “Pensando o futuro do seguro” apresentou as perspectivas para o setor diante dos desafios que se impõem nos cenários de defesa do consumidor, regulatório e da crescente judicialização dos conflitos entre empresas e segurados. A secretária da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), Juliana Pereira, afirmou que é preciso trazer para a pauta a questão da resolução dos conflitos e a interação com outros agentes públicos, no caso, os órgãos reguladores. Ela destacou que a Senacon vem desenvolvendo diálogo permanente com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e com a Superintendência de Seguros Privados (Susep), o que não ocorria tempos atrás. “Se partirmos do pressuposto de que o órgão tem que dar respostas muito rápidas e precisas para os consumidores, nós conseguimos projetar o futuro da seguinte maneira: estabelecendo a formação de consensos e a resolução de problemas. Temos que sair da superfície das questões. Consenso e oportunidade. Há uma oportunidade. O momento é de se despir dos preconceitos e buscar a melhor alternativa para a sociedade, encontrando um equilíbrio entre as duas partes”, enfatizou.
O diretor-presidente da ANS, José Carlos Abrahão, que também compôs o painel, enfatizou que o principal objetivo do órgão regulador é aumentar o acesso dos beneficiários ao sistema, proporcionando uma atenção de qualidade, segura, com atendimento humanizado e sempre primando pela sustentabilidade, sobretudo a assistencial. “Isso tudo com regulação e com princípios de governança e transparência, que tragam segurança jurídica para a sociedade como um todo. Temos regulação já determinada, direitos do consumidor que foram adquiridos e devem ser respeitados. Mas também temos que nos preparar para o diálogo. O diálogo é fundamental e temos que buscar a construção de um sistema que nos traga melhores de condições de atendimento, sempre atento ã questão tecnologia e da relação médico-paciente.”
Durante o mesmo painel, o superintendente da Susep, Roberto Westenberger, ressaltou que, no curto prazo, o objetivo da autoridade do mercado segurador é a garantia da sua estabilidade de gestão. No cenário de médio prazo, disse ele, a prioridade é a criação de uma diretoria de conduta de mercado dentro da autarquia e, a longo prazo, prevê a existência do que ele chamou de “duas avenidas”: uma é a da Tecnologia da Informação (TI) como elemento auxiliar da atuação regulatória, conjugando demandas vindas de órgãos de defesa do consumidor e dos tribunais, por exemplo. A outra é, por meio da prática do Big Data, ter uma eficácia maior do controle regulatório.
Ainda no painel “Pensando o futuro do seguro”, o ministro do Superior Tribunal de Justiça, Ricardo Villas Bôas Cueva, destacou que a grande promessa, com impacto direto no seguro, é o novo Código de Processo Civil. “O Código traz um novo paradigma, que é o chamado ‘tribunal multiportas’. A ideia é que, com ele, se tragam questões efetivas e não meramente formais, privilegiando a mediação e a conciliação entre as partes, que passarão a ser obrigatórias. A conciliação passará a ser aplicada nas relações de consumo simples. A mediação, para as situações mais complexas. A promessa é de que se caminhe para desjudicialização, não somente em questão às relações com o mercado de seguros, mas com outros mercados também”, explicou.
Marcio Coriolano, também integrante do painel, afirmou que o setor de seguros sente os efeitos da crise de forma retardada. O ciclo econômico se abate sobre as atividades que o seguro protege e as ondas vão se produzindo ao longo do tempo. “O país vem enfrentando uma crise recessiva há mais de dois anos, mas, em 2015, os efeitos passaram a ser sentidos pelo mercado. Na saúde suplementar, 2015 foi o primeiro ano em que se observou um decréscimo no número de beneficiários, pois, como grande parte das empresas busca cobertura para seus empregados, com o aumento do desemprego, houve uma redução do numero de beneficiários.”
Para Coriolano, o setor é resiliente, não só porque responde tardiamente aos ciclos, mas devido à preferência das pessoas pela proteção. E é exatamente este o momento de maior fragilidade do cidadão, quando se vê com incertezas, com insegurança, fora, ainda, a redução de renda. “Eu já fui regulador e sei que o setor sempre foi palco de conflitos. Primeiro, porque não existia esse ‘empoderamento’ do consumidor como há hoje. Segundo, porque seguro é mesmo algo complexo”, afirmou Coriolano. Com o crescimento da renda no Brasil, como nunca visto anteriormente, o consumidor passou a ter mais condições de exercer sua cidadania. Agora, como lembrou o presidente da CNseg, tudo está “virando de cabeça para baixo novamente”, por força do enfraquecimento dos três pilares da economia: produto, renda e emprego. “E é exatamente nesse momento em que o consumidor mais precisa de proteção. E proteger o consumidor é proteger quem fornece o serviço”.
Marcio defende que precisamos ter uma regulação para momentos de crise, que proporcione melhores condições para quem provêm os serviços. “Não é uma crítica, mas uma constatação: a regulação é muito baseada em estrutura. Quando se regula o detalhe do detalhe, isso é o que trava”, concluiu.
Após o painel que pensou o futuro, o presente urgente foi tratado no painel sobre epidemias, particularmente sobre a epidemia do Zika vírus, que alarma todo o mundo, contando com a participação do subsecretário da subsecretaria de Vigilância em Saúde do Estado do Rio de Janeiro, Alexandre Chieppe, do médico e comentarista da GloboNews, Luiz Fernando Correia. Mediadora do debate, a presidente da Federação de Saúde Suplementar (FenaSaúde), Solange Beatriz Palheiro Mendes, norteou as discussões ao questionar os palestrantes sobre pontos importantes acerca do tema como a existência de kits de testes suficientes para suprir a demanda do país, o preparo dos laboratórios e se já estão claras as indicações para o exame do Zika vírus.
“E o cenário não é nada animador”, segundo Chieppe, que afirmou vivermos uma emergência de saúde pública de interesse internacional, com possibilidade de pandemia. E entre os elementos agravantes estão a concentração de pessoas em áreas urbanas e até o aquecimento global, que amplia a área da presença do mosquito.
Outro grande aliado da doença, com capacidade de gerar grandes impactos, não só de saúde, mas também financeiros, é a desinformação. Como exemplo, Luiz Fernando Correia citou o caso dos testes de Zika, que são muito caros e nem sempre alcançam os resultados desejados. Entretanto, entre outros fatores, devido à pressão popular, as operadoras de planos de saúde deverão passar a ser obrigadas a oferecer o exame, enquanto esse recurso poderia ser melhor aplicado de outra forma. Complementando a fala de Luiz Fernando, o subsecretário disse que “vivemos uma epidemia de testes e dengue, mas nem todos sabem, por exemplo, que o exame só pode dar positivo após o 7º dia de infecção e, eventualmente, necessita ser feito diversas vezes no mesmo paciente”.
O último painel do 21º Encontro de Lideres teve a participação do cientista político Fernando Schuler, do economista Gustavo Franco, do presidente da FenaPrevi, Edson Franco, do jornalista Dony de Nuccio e do ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, debatendo o atual cenário político e econômico, considerado por todos como, no mínimo, desafiador, e, no curto prazo, o quadro negativo da economia tende a seguir em razão da ausência de instrumentos na área fiscal que gerem mudanças céleres. Por outro lado, o pessimismo deve se agravar pelos próximos meses, principalmente pela alta do desemprego. “Esse movimento de desemprego está apenas começando”, alertou Loyola. Já no médio e longo prazo, a crise colocou em evidência as limitações estruturais sérias do país, como a baixa produtividade, os gargalos na infraestrutura e o custo de previdência.
Já, para o cientista político do Insper, Fernando Schuler, o quadro político é ainda pior que o econômico, pois não há consenso de uma única agenda para o país. “Uma das saídas é renovar a geração de líderes. Atrair novos talentos. E para isso é preciso uma reforma política”, enfatizou.
O ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Roberto Barroso, concorda, citando que nas turmas acadêmicas onde leciona, nunca vê um aluno talentoso dizendo que pretende seguir carreira política. “Estamos vivendo um momento difícil. Temos crises política, econômica e de ética relevantes. Esse conjunto leva a uma sensação devastadora de que não vamos sair do lugar”, disse o ministro. Para ele, entretanto, que acredita que a cultura de tolerância com a corrupção está acabando, o desalento não terá sido em vão se estivermos construindo um país melhor. “Na minha vida adoto dois princípios. Enquanto não vier a bonança, faço o melhor que posso dentro do que me cabe, cumprindo o meu papel e sendo bom e correto, mesmo quando ninguém estiver olhando”, finalizou.
Fonte: CNseg, em 29.02.2016.