Quando se pensa nos desafios que o sistema enfrenta hoje deve-se evitar valorizar demais algo negativo como o crescimento vegetativo, pois no quadro atual há oportunidades também, disse ontem o titular da Previc, Carlos de Paula, ao se apresentar como um dos expositores, em Brasília, do IV Evento GAMA de Previdência Complementar – EGPC. Ele citou como aspectos favoráveis o crescimento do emprego formal, o aumento da renda, a expansão da classe média. Apontou também a postura positiva de sua autarquia, que está atenta a necessidades como desoneração, simplificação e aprimoramentos na fiscalização. No mesmo espírito, o Secretário de Previdência Complementar, Jaime Mariz, salientou ser o crescimento da previdência complementar essencial inclusive para que a Previdência Social e até os regimes próprios possam enfrentar melhor os seus desafios.
Antônio Fernando Gazzoni, Diretor Presidente da GAMA Consultores Associados, abriu o evento, que este ano contou com a participação de mais de duas centenas de pessoas de 90 organizações, entre fundos de pensão, empresas patrocinadoras, governo, consultorias e auditorias, de diferentes pontos do País. Gazzoni destacou a estagnação do crescimento do sistema de Fundos de Pensão, que vem repetindo quase que os mesmos indicadores de mercado nos últimos quatro anos, instigando assim, o debate sobre os “Desafios, Tendências e Inovações na Gestão dos Fundos de Pensão”, tema do IV EGPC.
As mudanças ocorridas na previdência complementar brasileira na última década, principalmente no que tange a regulamentação e o aumento tímido do sistema, foram tratadas também por Carlos Alberto Caser, Vice-presidentre da Abrapp. Ele defendeu um maior estimulo às empresas e representações de classe a ingressarem no sistema e disse que um dos caminhos para isso passa pela flexibilização. Trata-se de flexibilizar para melhor aproveitar as oportunidades e reduzir os custos administrativos. Caser destacou algumas propostas que poderiam incentivar o país a poupar mais, como o resgate parcial de reservas e alíquota zero de imposto de renda, além da necessidade de incentivo ao fomento, a desoneração do sistema e a simplificação do arcabouço legal.
Luis Ricardo Marcondes Martins, Diretor da Abrapp e moderador do primeiro painel, notou que o sistema de Previdência Complementar Fechado é um produto de excelência mas, como tudo, também envelhece. Portanto, o desafio é entender o contexto e inovar. E buscando sempre avançar em assuntos em pauta como o resgate parcial e adesão automática e, lógico, sem se descuidar para manter conquistas obtidas até o momento. Ele ainda defendeu o tratamento diferente para os desiguais e a segurança jurídica dos contratos.
Já o advogado Adacir Reis, outro expositor, apontou como principais desafios o longo prazo, a longevidade, a tecnologia da informação, a educação financeira e previdenciária, a estabilidade regulatória, a fiscalização melhor exercida e a segurança jurídica. Reis enfatizou que não podemos esquecer os desafios já vencidos, como por exemplo, o marco da regulamentação da FUNPRESP, mas o sucesso passado deve servir como fonte inspiradora para que o sistema enfrente os novos desafios, algo necessário não só para o crescimento dos Fundos de Pensão, mas também para sua sobrevivência. Dentre os desafios, Adacir destacou que o da segurança jurídica tem sido vencido, uma vez que o judiciário começa a compreender a realidade do sistema e começamos a trabalhar com referências mais previsíveis.
Diante do contexto e expostos os desafios do sistema de Previdência Complementar Fechada, outro painel trouxe as visões institucionais sobre as tendências e oportunidades do sistema. Nélia Pozzi, mediadora do painel, reforçou que a estagnação do sistema deve servir de impulso para identificação de tendências e a busca por novas oportunidades que tornem o sistema cada vez mais atrativo para o retorno do crescimento.
Ambição definida - O painel de encerramento do IV EGPC teve por objetivo demonstrar o que há de novo para os Fundos de Pensão. Foi moderador o dirigente Silvio Rangel (Fibra), representante da Abrapp na Comissão Temática 4 do CNPC (precificação e solvência), que defendeu a necessidade de soluções duradouras para o equilíbrio dos planos e cumprimento dos pactos com partipantes e patrocinadores/instituidores.
Gazzoni começou reafirmando que o mundo está constantemente em transformação e, como não poderia ser diferente, o sistema de Previdência Complementar Fechada também está. A principal mudança do sistema, a migração de planos BDs para os planos CDs, foi motivada pela elevação dos riscos vinculados principalmente a taxa de juros atuarial e ao aumento da longevidade, contudo os planos na modalidade CD despertam dúvidas principalmente nos participantes. Nesse cenário, destacou Gazzoni, é preciso encontrar o equilíbrio entre a proteção dos participantes/assistidos e os riscos para o patrocinador.
O convidado internacional do evento este ano, com mais de 30 anos de experiência no mercado de previdência complementar no Reino Unido, foi Andrew Vaughan, presidente do Defined Ambition Industry Working Group, criado pelo UK Department of Work & Pensions em 2012 para revisar e fazer recomendações sobre previdência corporativa/empresarial no Reino Unido, que resultou em um projeto de lei apresentado em junho deste ano.
Andrew apresentou primeiramente o cenário econômico e político do Reino Unido e o Grupo de Trabalho criado para estudo da modelagem de Ambição Definida. Tal grupo foi criado pelo Ministro da Previdência do Reino unido em 2012 e contou com participação de representantes de fundos de pensão e de participantes e assistidos. O relatório inicial do trabalho foi apresentado em novembro de 2012 e em junho de 2014 surgiu o projeto de lei sobre o assunto.
O palestrante demonstrou que os Planos BD do Reino Unido apresentam um déficit de £708 bilhões, em face de um total de ativos de £1.119 bilhões, sendo que 86% estão fechados a novas adesões. Nesse cenário observou-se uma redução de mais de 15% nos planos nesta modalidade. Por outro lado, os Planos CD, atualmente os que mais apresentam adesões, também passaram a demonstrar dificuldades: os rendimentos caíram 60% de 1990 pra cá, a alta volatilidade dos preços de mercado e da taxa de juros, o alto custo administrativo de manutenção destes planos e o desconhecimento dos participantes quanto aos tipos de investimentos. Somado aos cenários dos planos nessas duas modalidades tem se observado no Reino Unido que as pessoas não estão poupando o suficiente para suas aposentadorias.
Diante deste contexto o estudo sobre a modalidade de Ambição Definida teve por objetivo buscar oferecer uma alternativa às atuais modelagens de planos existentes no Reino Unido, no qual os riscos possam ser compartilhados entre Patrocinadores e Participantes e os primeiros tenham maior certeza quanto ao benefício a ser recebido na aposentadoria. Para que um Plano de Ambição Definida seja atrativo, ele deve ter um custo razoável no longo prazo, ser mais justo entre os atuais e futuros Assistidos e ter transparência das informações, decisões e riscos. Além disso, a regulamentação destes Planos deve oferecer maior inovação na busca do melhor atendimento das expectativas.
Andrew, portanto, demonstrou que, diferentemente das demais modalidades, a Ambição Definida não oferece apenas uma única estrutura, sendo dadas alternativas dentro da mesma modalidade. Com base nisto, apresentou três alternativas aos atuais Planos de Benefício Definido: i) pagamento de benefícios extras e flutuantes; ii) conversão automática para modalidade CD quando da cessação do vínculo empregatício, reduzindo o risco da longevidade; e iii) planos com previsão de ajuste da idade de aposentadoria a depender da variação da expectativa de vida. Na mesma linha, foram apresentados quatro alternativas para os atuais Planos de Contribuição Definida: i) garantia de reembolso de pelo menos o valor nominal das contribuições vertidas ao Plano; ii) garantia de retorno do capital e dos investimentos pelos administradores; iii) contratação de seguro para cobertura do benefício de aposentadoria; iv) parcela das contribuições dos participantes seria usada para comprar uma anuidade nominal diferida, a ser paga a partir de sua idade de aposentadoria, e, o restante das contribuições, seria investido coletivamente em ativos de risco.
Por fim, Andrew enfatizou que os Planos de Ambição Definida não significarão uma mudança abrupta no segmento, já que sua estrutura permite adequações quando das alterações normativas. Ao mesmo tempo tais planos serão alternativas para os problemas observados na modalidade de Contribuição Definida, uma vez que os planos de Benefício Definido apresentam poucas perspectivas de sobrevivência. Assim, os estudos relacionados à Ambição Definida podem significar uma reformulação completa do panorama previdenciário do Reino Unido.
No fechamento do painel e do IV EGPC, José Edson da Cunha Júnior, Secretário-Adjunto da SPPC, iniciou citando, além dos desafios mencionados pelos demais palestrantes, outros problemas brasileiros que impactam indiretamente o sistema, como o alto custo com a saúde, aumento do consumo por bens e serviços, crescimento do endividamento da população e reajustes salariais cada vez menores. Diante dos desafios, Cunha ressaltou a necessidade de que todos os atores devem buscar caminhos para fortalecimento da previdência complementar. A iniciar pelos participantes atentos ao nível de endividamento e ao planejamento de sua previdência, passando pelas Entidades que devem buscar atender às expectativas dos seus Participantes, Assistidos e Patrocinadores, com proatividade na gestão e comunicação clara com todos os atores do sistema, até o Governo, que deve estar atendo à necessidade de aumento da cobertura da previdência complementar fechada. Adiantou também que estão sendo realizados trabalhos no sentido de ajustar questões relativas à tributação e à flexibilidade das modelagens de planos, além de ampla pesquisa com participantes. Cunha reforçou que o Governo está atento a futuras necessidades como criação de novos incentivos às empresas, viabilização de planos setoriais, novas modelagens, criação de programas de educação previdenciária e uma ampla campanha de divulgação da Previdência Complementar.
As apresentações realizadas pelos palestrantes encontram-se disponíveis no site do evento www.egpc.com.br
Fonte: Diário dos Fundos de Pensão, em 19.09.2014.