Por Martha E. Corazza
O aparato constitucional brasileiro é suficiente para afastar a incidência do ITCMD – Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação – sobre a conversão de reserva previdenciária a beneficiários dos planos de benefícios administrados por Entidades Fechadas de Previdência Complementar, uma vez que não há transmissão de direitos entre os participantes e seus beneficiários. A conclusão foi detalhada pela advogada tributarista Patrícia Linhares, na última quinta-feira (15), durante mesa redonda realizada pelo Cejuprev – Centro de Estudos Jurídicos da Previdência Complementar, em São Paulo. Linhares é autora de parecer solicitado pela Abrapp sobre o assunto e que será fundamental para as discussões do sistema em torno do ITCMD. “A constituição não autoriza essa incidência e, além disso, no caso das legislações estaduais do Rio de Janeiro e do Paraná, que prevêem expressamente a incidência sobre as EFPCs, a medida é claramente aplicável apenas às entidades abertas e não às fechadas”, aponta Linhares.
A mesa redonda abordou ainda o tema da Estabilidade Jurídica do Contrato Previdenciário como Fomento da Previdência Complementar Fechada, abordado em suas várias nuances pelo diretor presidente da Fundação Banrisul, o advogado José Luiz Ferri Berzagui. Para ele, os esforços coletivos do sistema no sentido de consolidar o respeito ao contrato previdenciário junto ao STJ são parte fundamental do fomento aos fundos de pensão. A questão do respeito ao contrato previdenciário é a base do trabalho do Cejuprev, explica seu coordenador, José de Souza Mendonça: “Nos últimos anos o sistema já conseguiu avanços expressivos nesse sentido e muitos resultados junto ao STJ, por conta de um trabalho coeso que tem sido desenvolvido desde 2009”.
Incidência de ITCMD – Diante das recentes baixas nas receitas tributárias estaduais, algumas legislações já partiram em busca de outras fontes, explica Patrícia Linhares, e o ITCMD sobre a conversão de reservas dos beneficiários de planos administrados por fundos de pensão entrou nesse foco. “Segundo o art. 155, I, da Constituição, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993, compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir imposto sobre transmissão causa mortis e doação, de quaisquer “bens” ou “direitos” e o referido imposto incide, pois, sobre o ato não oneroso de transmissão de propriedade, ou seja, dos efeitos da relação jurídica tutelada pelo Direito Civil, que envolve o proprietário e o seu sucessor hereditário”.
No caso de falecimento de participante de plano de benefício complementar fechado, porém, não há transmissão do direito à complementação de aposentadoria ao beneficiário, mas ocorre o término da relação jurídica obrigacional que a EFPC mantinha com o seu participante e o nascimento de uma nova obrigação entre a EFPC e o beneficiário, para a complementação da pensão.
Além disso, a advogada avalia aspectos específicos da lei do Estado do Paraná nº 18.573/2015, que prevê expressamente a responsabilidade tributária das EFPC em relação ao ITCMD, e conclui que inexiste base legal para exigência do tributo diante da incompatibilidade de planos operados por EFPC e aplicações financeiras. Já no caso da Lei do Estado do Rio de Janeiro nº 7.147/2015, a responsabilidade tributária da entidade pela retenção e recolhimento do tributo abrange apenas as entidades abertas de previdência complementar. “As entidades abertas são administradoras de planos de benefícios aos quais são vinculados fundos de investimento cujas quotas são detidas individualmente pelos participantes e tomadas como base de cálculo para tributação naquele Estado”. A questão da base de cálculo, portanto, deixa explícita a limitação da legislação às entidades abertas, segundo entende Patrícia Linhares. Caberá agora ao sistema colocar em discussão os prós e os contras de entrar ou não com questionamentos jurídicos em relação a essas legislações.
Contrato previdenciário - As possibilidades de retomada do crescimento do sistema de previdência complementar fechada estão estreitamente ligadas às iniciativas de fomento por meio do respeito ao contrato previdenciário, com a mudança do cenário de litigiosidade, avalia Jorge Berzagui. “O respeito ao contrato previdenciário tem que prevalecer em qualquer instância, um conceito que parece simples mas que ainda não é compreendido por muitos juízes brasileiros”, afirma o diretor presidente da Fundação Banrisul. Ele pondera que nos últimos anos houve avanços importantes que ajudaram a criar uma divisão entre as diversas turmas do Judiciário, algumas delas já plenamente convictas das características do contrato previdenciário. “Temos trabalhado muito nesse sentido na Fundação Banrisul e, como resultado, hoje o Judiciário no Rio Grande do Sul já está dividido, com uma Câmara favorável às ações das EFPCs e outra, ainda não”.
A estratégia que tem dado melhores resultados, avalia Berzaqui, é a de convencimento de juízes e desembargadores por meio de conversas sobre cada tema, num trabalho intensivo que tem encontrado boa receptividade. Ele lembra que houve avanço importante na revogação da Súmula 321, assim como em outras matérias. Entre as diversas questões fundamentais para o fomento do sistema, está a discussão sobre o início da validade jurídica do contrato previdenciário, se na adesão ou na elegibilidade. “Somos pela segunda opção e diversos juízes já entendem assim mas houve uma audiência pública e o processo parou, então ainda há o risco de que a matéria tenha uma resposta modulada, o que seria uma virada de mesa prejudicial ao sistema”, explica o dirigente. Berzagui destaca a importância do trabalho contínuo da Abrapp para informar o Judiciário a respeito das características do sistema previdenciário fechado, esforço que deve ser cada vez mais desenvolvido junto aos magistrados e também aos seus auxiliares.
Fonte: Diário dos Fundos de Pensão, em 19.04.2016.