Por Martha Corazza
Alinhada com as discussões entre a equipe técnica da Previc e o sistema de EFPCs representado pela Abrapp, a Instrução Normativa Previc nº 23, publicada no último dia 29 de junho, traz um conjunto de regras para a elaboração dos estudos de adequação das hipóteses atuariais dos planos de benefícios que tem sido considerado adequado e coerente. Ao unificar as orientações e procedimentos contidos nas Instruções Previc nº 01 e nº 07, ambas de 2013, a nova Instrução tem recebido avaliação positiva dos especialistas e dos dirigentes de fundos de pensão, ainda que haja sugestões para eventuais ajustes pontuais em alguns aspectos. Ela entrará em vigor obrigatoriamente a partir de 2016 e sua aplicação pelas Entidades em 2015 será facultativa.
Vale lembrar que o novo normativo incluiu algumas importantes sugestões encaminhadas pela Abrapp. Entre elas, a decisão de dar tratamento diferente para as Entidades que aplicam taxas de juros atuariais dentro do intervalo entre o piso e o teto estabelecidos pela regulação e para aquelas cujas taxas ficam fora desse intervalo. “Não haveria porque exigir o mesmo nível de detalhamento de informações daquelas que cumprem o intervalo, que são a maioria”, diz o diretor superintendente da Fibra e Coordenador da Comissão Ad Hoc de Precificação e Solvência, Sílvio Rangel. A preocupação da Abrapp ao defender essa medida foi a de evitar o risco de uma regra que expandisse as exigências da Instrução 01 para todas as EFPC, independentemente do risco envolvido em suas hipóteses. “Desse modo foi possível unificar de maneira adequada”, avalia Rangel. Entre os pontos passíveis de ajustes para aperfeiçoar a nova regra, ele lembra que o inciso IV do artigo 6º impõe a apresentação de planilha eletrônica que contenha as rentabilidades anuais esperadas para todo o período projetado, em relação a cada um dos segmentos de investimento, que devem ser idênticas àquelas utilizadas para projetar os fluxos de investimentos. “No texto não fica claro, entretanto, se essa rentabilidade será a real, acima da inflação, ou nominal, então é importante que esse ponto esteja bem claro”.
Outro aspecto em que haveria necessidade de ajuste, sugere Rangel, é no que diz respeito aos fluxos anuais projetados até a data estimada do pagamento do último benefício do plano (parágrafo 3º do artigo 6º). “Considerando que as projeções macroeconômicas não alcançam um horizonte tão longínquo, que pode chegar a 70 anos, seria mais realista ter uma análise que levasse em conta o fluxo do passivo até a data da duration do plano”, pondera Rangel. Até porque a proposta é analisar a coerência da rentabilidade esperada e a duration seria suficiente. Ele ressalta ainda o fato de que no cálculo da duration dos títulos de renda fixa pós-fixados o prazo desses papéis deve ser considerado como nulo (parágrafo 7º do artigo 6º), “o que não é a fórmula mais adequada”.
Questões operacionais - No plano operacional, a norma estabelece que a data do cadastro utilizado no estudo não poderá estar defasada em mais de seis meses em relação à data base do estudo. Mas, como o cadastro do fechamento do ano normalmente é defasado em pelo menos dois meses, então se a data base tiver um prazo máximo de seis meses os estudos terão que ser apresentados ainda no primeiro trimestre. “Isso irá encurtar o prazo e poderá resultar em estudos desatualizados, esse limite de seis meses é desnecessário e poderá criar problemas operacionais”, diz Rangel. Ele defende maior elasticidade no prazo de defasagem, a não ser em casos específicos em que tenham ocorrido alterações expressivas no cadastro. Finalmente, no caso do prazo de até três meses para que a Previc decida se vai autorizar ou não o uso de taxa de juro fora do intervalo, a sugestão é de que esse período seja reduzido para dois meses. “A espera por três meses pode reduzir demais o prazo para que as EFPC tomem suas decisões”.
De modo geral, acredita Rangel, não deverá haver aumento significativo de custos, apenas algumas exigências adicionais para quem estava na Instrução 07 mas nada tão expressivo em relação ao que já era feito. Ao mesmo tempo, ele sublinha que a Previc agora tem um “acervo fabuloso de dados enviados pelas EFPC”. O ideal para o futuro, sugere Rangel, será ter esse acervo, com as análises e resultados obtidos pelo órgão regulador, devidamente disponibilizado ao sistema para enriquecer a confecção de seus próprios estudos.
Aperfeiçoamento regulatório - “A nova Instrução segue a linha de aperfeiçoamento regulatório que começou com a exigência de realização de testes de aderência e prosseguiu com a diferenciação entre testes demográficos e testes de taxas de juros, o que em linhas gerais tem sido coerente com a proposta de tratar as EFPC de maneira diferenciada, de acordo com o seu nível de risco”, observa o consultor sênior da Mercer, Eder Carvalhaes. Entretanto, no caso da Instrução 23 ainda será preciso avaliar o impacto para saber se o maior refinamento na realização dos estudos trará o devido retorno para os planos de benefícios em termos de transparência e qualidade.
“Teremos que avaliar a relação custo benefício desse refinamento, porque ele certamente trará algum acréscimo de custos para as EFPC, então resta saber quais serão os benefícios em termos de governança”, lembra Carvalhaes. Esses custos não serão os mesmos para todas as EFPC, destaca o consultor, e decorrerão do aumento de horas de trabalho exigidas para cumprir as exigências do normativo, agora um pouco mais complexas.
Planilhas - A principal vantagem da nova Instrução é a de tornar mais homogêneo o tratamento dispensado pela regulação aos estudos de adequação das hipóteses atuariais e eliminar as diferenças que as Instruções 01 e 07 mantinham, reforça a coordenadora da CTN de Atuária da Abrapp, Cleide Barbosa da Rocha. “As Entidades que estavam enquadradas no quadro da Instrução 07 ganharam o direito de cumprir vários itens da nova norma de maneira facultativa”. Para esse grupo, que representa a maioria, o impacto será portanto apenas na maneira de informar os resultados dos estudos, já que até agora eles ficavam restritos ao âmbito interno das EFPC e passarão a ser disponibilizados à Previc em suas planilhas. Já as Entidades que entravam no quadro da Instrução 01 não terão mudanças significativas porque o nível de exigências é praticamente o mesmo. “Quem fazia os estudos pela Instrução 01, fará agora pela Instrução 23 com tranquilidade”, afirma a atuária.
Distorções corrigidas - Na avaliação feita pelo diretor da Gama Consultores Associados, Antonio Fernando Gazzoni, e pelo supervisor atuarial da Gama, Frederico Schulz Diniz Vieira, “é preciso parabenizar a Previc por ter aberto o diálogo com a sociedade na elaboração da nova norma, o que se refletiu no texto final porque grande parte das sugestões da Abrapp e outros agentes do mercado foram atendidas”. Por conta disso, a Instrução 23/2015 ficou mais adequada às expectativas criadas e à importância do tema no contexto da precificação do passivo dos planos de benefícios.
“O novo normativo atendeu sim às expectativas do sistema, pois corrigiu uma distorção trazida pelas normas mais antigas, que previam, e continuarão prevendo até a revogação em 01/01/2016, métodos distintos de realização do teste de convergência da taxa real de juros”, dizem os atuários da Gama. Esse tratamento distinto criava uma desigualdade entre planos que não deveria existir, pois a premissa de taxa real de juros tem a mesma fundamentação e aplicação para todos os planos, respeitada a modalidade de seus benefícios e fundos, independentemente de estar ou não dentro dos limites legais. Portanto, a Instrução 23/15 passa a prever uma forma única de realização do teste de convergência, exigindo que todos os estudos observem todo o horizonte de projeção do fluxo do passivo para realização dos cálculos.
Outras novidades, ressalta Gazzoni, são a maior clareza e evidenciação das informações que fundamentam os estudos técnicos de aderência e convergência, exigindo mais atenção, cooperação e responsabilidade de todas as partes envolvidas: atuário, as diversas áreas da EFPC e patrocinadores e instituidores. Nesse cenário de maior integração, ele enfatiza que “caberá um papel importante aos atuários, como responsáveis técnicos pelos estudos, de exercer a função de interlocutor, agregando diferentes visões sem perder de vista o emprego da boa técnica que deve ser utilizada na confecção desses estudos”.
Ele observa ainda que a nova Instrução apresenta as necessárias orientações e definições que haviam ficado pendentes depois da publicação em 2014 da Resolução MPS/CNPC 15, esta já em vigência obrigatória a partir deste exercício. “Verifica-se a preocupação da Previc em desonerar em algumas situações os planos de benefícios, quando faculta a adoção de procedimentos mais simplificados, o que é altamente positivo, vez que tal desoneração teve o cuidado de não ferir a observância de patamares mínimos necessários à boa gestão desses planos”. Além disso, diz Gazzoni, é um avanço porque torna cada vez mais claro o papel dos atores nos estudos de aderência e convergência, explicitando as responsabilidades do ARPB (Administrador Responsável pelo Plano de Benefícios) e do AETQ (Administrador Estatutário Tecnicamente Qualificado) quando da prestação de informações ao atuário.
“A norma se constitui em avanço no que se refere à precificação do passivo, sendo que eventuais ajustes poderão ser realizados oportunamente, até porque há uma nítida disposição da Previc em estar atenta às sugestões emanadas das EFPC por meio de suas entidades representativas quando estas se demonstram válidas”, diz Gazzoni. Ele vê espaço para evoluções futuras na Instrução nº 23/15, principalmente no que diz respeito a novas desonerações, como por exemplo, a eliminação da exigência de algumas informações pela Previc nos estudos técnicos de aderência/convergência, considerando que algumas delas já são enviadas devido a exigências de outros normativos.
Fonte: Diário dos Fundos de Pensão, em 06.07.2015.