Por Marcos Baby1 e Ângela de Araújo Rosa2
Se para você regime progressivo é uma dieta pesada, prêmio é aquilo que você ganha e não o que você paga, averbadora é uma moça que usa muito verbo e assistido é o galã da novela... Parabéns! Você é um consumidor comum.
Esses e tantos outros termos utilizados por todas as empresas de previdência complementar são conhecidos como “termos técnicos”, amados por aqueles ligados ao “tecniquês”, mas que apenas dificultam a vida do cliente.
O setor de seguros, em sua maioria, trabalha com palavras confusas que propiciam um Deus nos acuda na cabeça do consumidor brasileiro, e mudar esse cenário, é um desafio e tanto para as empresas e órgãos reguladores.
A escrita é um processo simbólico que possibilitou ao homem expandir suas mensagens para os mais longínquos cantos do planeta terra. Mesopotâmia, China, Egito, em diversos pontos do mundo, ela se desenvolveu e foi permitindo que as pessoas se conectassem, tornando possível que transmissor e receptor estabelecessem contato e entendimento.
O conhecimento ganhou força pela escrita e foi disseminado por poucos a muitos, principalmente com o desenvolvimento das cidades e pela necessidade da informação continuada. Assim, com o desenvolvimento cada vez mais profundo da educação e pela eterna necessidade do ser humano de ampliar seus horizontes, a escrita também teve que evoluir. Não bastava apenas transmitir uma informação, era imperativo incluir termos mais rebuscados, como uma forma de separar a população em castas, sendo aqueles que tinham o poder da cultura mais importantes do que aqueles que apenas seguiam os nobres dentro de sua “ignorância”.
O mundo gira e hoje, mais de 5000 anos depois, o critério é outro e a forma ainda mais distinta. O que se busca é o entendimento, a compreensão pela palavra, pela imagem, pelo Facebook, pelo Instagram. Não importa mais falar complicado, o que se busca é o entrosamento, o compartilhamento de valores e objetivos comuns, conectados por um ou vários tipos de relações virtuais e sociais.
Definitivamente, o momento exige a adoção de uma linguagem mais amigável e acessível, que permita criar um ambiente que acolha as diferentes classes sociais, com estímulos corretos e objetivos. Não basta dizer que o plano chegou ao fim do prazo de diferimento, precisa explicar que o contrato terminou. Benefício de risco? Tá louco! Precisa explicar que tipo de “seguro de vida” está embutido no plano. Está abolido falar benefício fiscal... Afinal, como uma coisa pode ser boa (benefício) e ruim (fiscal) ao mesmo tempo? Por que não dizer logo que se reduz o quanto se paga de imposto?
Cotas, custodiante, comunicabilidade... Tudo isso confunde o consumidor. Seria melhor dizer que cotas são partes iguais de um fundo de investimento; que custodiante é aquele que guarda seu dinheiro; e que a comunicabilidade é quando seu seguro de vida ou pensão é pago pelo seu saldo do plano quando você ficar inadimplente. Outro bom exemplo é Provisão Matemática de Benefícios a Conceder. Não seria mais fácil dizer que é o total de dinheiro que o cliente economizou na Previdência e tem o direito de receber?
Paulo Henrique Amorim3, em meio a mediação no VII Fórum de Seguro de Vida e Previdência ocorrido ano passado, comentou “Vocês precisam se comunicar de forma mais acessível, pois eu tive de consultar o manual de economia para entender o resumo do setor que me enviaram, para que eu me preparasse para mediar essa discussão”. Ele está certo! O mercado precisa criar meios de transmitir o conceito e a ideia da previdência de uma forma que permita seu entendimento. Mesmo que PGBL e VGBL já tenham certo apelo à uma parcela da população, por que não chamar de plano de aposentadoria para quem declara imposto de renda e para quem não declara, respectivamente?
A era da informação clara, simples e objetiva ganha destaque, não apenas porque o jovem Código de Defesa do Consumidor, agora com 25 anos, assim ordena, mas porque o cliente da classe C precisa entender o que significa taxa de administração, carregamento e excedente financeiro - diga-se de passagem que esse último nem mesmo quem está no setor de previdência sabe explicar.
Observe que o mesmo ocorre no direito brasileiro. Em 2005 a Associação dos Magistrados já lançava uma campanha contra o “Juridiquês”, evitando o uso desnecessário e excessivo do jargão jurídico e de termos técnicos de Direito perante o grande público.
Certa vez o réu, seu advogado e o promotor acompanhavam as palavras finais do juiz proferindo a sentença: “Ao lume do expositado, JULGO CONCLUDENTE a Pretensão
Punitiva Estatal, aos denunciados, devidamente qualificados in follio, nas sanções do art. 157, § 2º, inciso II, do Código Penal. Indefiro o pedido ministerial acerca da fixação de valores mínimos para indenização, com base nas razões já expendidas (art. 387, Inciso IV, do CPP). Atendendo ao sistema trifásico adotado pelo Código Penal, no seu art. 68, sopesadas as circunstâncias judiciais do art. 59 e o disposto no art. 49, do mesmo Codex...”. Logo, o réu pergunta ao advogado: “doutor estou preso ou solto?”.
Dessa mesma forma, muitos consumidores se sentem perdidos em relação aos termos técnicos utilizados pelas seguradoras. Sentem-se presos a um emaranhado de palavras que tem quase nenhum significado para eles. A simplicidade leva ao conhecimento e o conhecimento torna tudo mais simples. É um movimento recíproco, que propicia entendimento entre a população mais e menos provida de educação.
Leonardo da Vinci já dizia: "A simplicidade é o último grau de sofisticação." E o difícil é alcançá-la, torná-la real e com isso permitir o entendimento da população. A revolução pela mudança deve partir de todos aqueles que atuam no setor de previdência, mas pode ter um início principalmente naqueles que se deparam com o cliente no dia a dia, ou seja, nas agências bancárias, por meio dos corretores ou consultores, ouvidorias, centrais de relacionamento (0800) e outros canais de comunicação direta com o cliente.
Fomentar essa mudança, quebrar paradigmas, pensar e promover a inovação dos conceitos significará permitir ao cliente da previdência, de uma vez por todas, um entendimento daquilo que compra e saber usufruir desse produto de segurança familiar e de proteção financeira, sem medo ou preocupação.
Transformar palavras como fim de diferimento, proteção de risco, comunicabilidade e autopatrocínio, em algo inteligível ao consumidor é um dos grandes desafios desse setor. Tão importante quanto mudar a forma como o brasileiro cuida das suas finanças no longo prazo, a começar pelo hábito de se guardar dinheiro.