
A Casa do Seguro, em Belém, reuniu lideranças do Brasil e do exterior, na tarde deste sábado (15), para discutir como o setor de seguros e o sistema financeiro podem acelerar a transição climática, reduzir a lacuna de proteção e integrar riscos ambientais e sociais às suas estratégias.
A programação começou com o painel “Do conhecimento à ação: a jornada do setor financeiro”, que apresentou os resultados do trabalho conjunto entre a Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) e a Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
Ao longo de 2025, as três entidades promoveram seis capacitações e estruturaram uma agenda integrada de transição climática para o sistema financeiro. A assessora de Sustentabilidade da Febraban, Thais Tannús, destacou o caráter pioneiro da iniciativa, enquanto a diretora de Sustentabilidade da CNseg, Claudia Trindade Prates, ressaltou a importância da cooperação entre instituições. "Somos indutores de sustentabilidade. Juntos, conseguimos fazer mais", afirmou.
Cacá Takahashi, diretor da Anbima e coordenador da Rede Anbima de Sustentabilidade, reforçou o papel da colaboração entre equipes e instituições. O painel concluiu com o compromisso de dar continuidade à agenda após a COP30, incluindo projetos em educação financeira, inventários de carbono setoriais e estudos sobre seguros de desastres e mercado de capitais.
Global Sustainable Insurance Summit destaca o setor de seguros
Em seguida, a CNseg e a UNEP FI abriram o “COP30 Global Sustainable Insurance Summit”, fórum dedicado ao debate Net-Zero, natureza e transição justa no setor de seguros. Claudia Prates sublinhou o destaque inédito do setor na COP: “Estamos sendo referências em diversos eventos, algo nunca visto anteriormente.”
Jéssica Bastos, diretora da Susep, abordou a relação entre riscos climáticos e desafios estruturais de países em desenvolvimento, defendendo planejamento e ação coordenada.
Butch Bacani, chefe de Seguros da UNEP FI, anunciou que cada sessão traria um lançamento inédito da ONU para acelerar a agenda global de seguros sustentáveis. “Precisamos fazer mais, sermos mais inclusivos. Em toda sessão hoje, vamos lançar algo novo para mover essa agenda de seguro sustentável.”
ONU lança guia global para integração entre seguros e investimentos
O painel “Planos de Transição: acelerando e ampliando uma transição justa rumo a uma economia Net-Zero resiliente” marcou o lançamento do guia global “A Total Balance Sheet Transition”, desenvolvido pelo Fórum de Transição em Seguros da ONU (FIT). Segundo Bacani, o documento é pioneiro ao conectar portfólios de investimentos e seguros numa mesma estratégia de descarbonização.
Claudine Blamey, diretora de Sustentabilidade do Grupo Aviva, relatou a evolução dos planos de transição da segurança, enfatizando a importância da execução. Catherine Chazal, do Grupo AXA, apresentou iniciativas de capacitação e adaptação climática envolvendo 80 mil funcionários.
Já Patrícia Coimbra, diretora de Gente e Cultura da Porto, destacou os quatro pilares da estratégia de sustentabilidade da empresa: capital humano, mudanças climáticas e circularidade, produtos sustentáveis e engajamento da cadeia de valor. Jéssica Bastos encerrou o painel alertando para o desafio do regulador de avanço na agenda climática sem criar barreiras de mercado.
WWF apresenta relatório sobre lacuna de proteção
O painel a seguir foi dedicado ao lançamento do relatório global do WWF sobre a lacuna de proteção securitária em um cenário de agravamento das mudanças climáticas.
Aaron Vermeulen, diretor global de Finanças para a Natureza do WWF Internacional, mostrou como os eventos extremos e a degradação ambiental têm causado prejuízos crescentes, especialmente em países em desenvolvimento.
Vermeulen defendeu que o enfrentamento desses riscos exige ação integrada entre mercado segurador e políticas públicas de mitigação, conservação e restauração ambiental. Ele destacou que soluções baseadas na natureza geram alto retorno econômico e danos em eventos climáticos extremos.
Clima e natureza: agendas indissociáveis
No painel “Assegurando um futuro resiliente e positivo para a natureza”, Butch Bacani reafirmou a conexão entre clima e biodiversidade, apresentando o novo guia da ONU para integrar riscos e oportunidades associadas à natureza. Mais de 60 seguradoras e organizações já participam do grupo global sobre o tema.
Aurelie Fallon Saint-Lo, head of Sustainable Underwriting do Grupo AXA, destacou o seguro de restauração de ecossistemas do AXA Climate, aplicado em países como Filipinas e México. Hiroko Urashima, senior Sustainability Specialist da MS&AD Insurance Group, destacou que as seguradoras precisam reconhecer seu papel na degradação dos ecossistemas ao financiar e assegurar atividades insustentáveis: “Aceleramos esse tipo de urbanização.”
Mónica Zuleta, diretora corporativa de sustentabilidade da MAPFRE, apresentou iniciativas inovadoras à integração da natureza na estratégia corporativa, incluindo seguros para recifes e florestas.
Frederic Olbert, cofundador da Carbonpool, discutiu os seguros que protegem o mercado de carbono contra riscos estruturais. Chip Cunliffe, da Ocean Risk and Resilience Action Alliance, destacou o potencial das soluções oceânicas para reduzir riscos em comunidades costeiras e o uso de tecnologia para identificar pesca ilegal.
O painel reforçou a diversidade de caminhos possíveis para que o setor de seguros impulsione uma economia positiva para a natureza.
Transição justa e inclusão social
O último painel da tarde, “Assegurando uma transição justa”, apresentou o relatório da UNEP FI sobre o tema na América Latina. Para Bacani, a transição climática só será bem-sucedida se for inclusiva: “Precisamos incluir, não excluir, as pessoas.”
Mabyr Valderrama, diretora de sustentabilidade da Fasecolda (Colômbia), apresentou experiências de restauração de ecossistemas e programas de educação financeira voltados à inclusão.
Richard Choularton, do Programa Mundial de Alimentos (WFP), mostrou como os microseguros têm ajudado comunidades vulneráveis a enfrentar secas e enchentes, reforçando a importância da proteção financeira combinada aos mecanismos de apoio.
Soenke Kreft, executive Director da MCII, e Craig Pettengell, co-líder de seguros da Climate Champions, defenderam a integração entre políticas públicas, microseguros e soluções paramétricas voltadas para pequenos produtores. O debate concluiu com consenso: sem inclusão social, não há transição justa nem sustentável.
Um setor em transformação
Ao longo da programação, os painéis da Casa do Seguro revelaram um setor financeiro mais articulado, inovador e comprometido com o enfrentamento da crise climática.
Da capacitação conjunta entre CNseg, Anbima e Febraban ao lançamento de guias globais da ONU, das discussões sobre natureza e biodiversidade às estratégias para promover uma transição justa na América Latina, ficou evidente que o seguro e o sistema financeiro ocupam um papel crescente na agenda climática.
As apresentações apontaram caminhos concretos para fortalecer resiliência, ampliar proteção, integrar riscos ambientais e sociais e aproximar governos, empresas e comunidades. Em comum, prevaleceu a mensagem de que enfrentar a crise climática exige colaboração, inovação e ações que coloquem as pessoas no centro da transição.
Inovação e cooperação para acelerar a transição climática

O papel estratégico na transição climática foi o fio condutor dos painéis conduzidos pela Prudential na manhã deste sábado (15), na Casa do Seguro — espaço de debates da CNseg na COP30. A avaliação dos participantes é que a inovação em produtos, a regulação e a cooperação internacional são pilares para acelerar essa agenda. Contudo, apesar dos avanços, o setor ainda enfrenta obstáculos, como o limitado financiamento para redução de riscos de desastres, a baixa disseminação da cultura de prevenção, sobretudo entre populações vulneráveis.
Nos debates, os especialistas apontaram que, com melhor governança, uso qualificado de dados e articulação entre governos e iniciativa privada, as seguradoras podem mobilizar capital social e econômico para proteger vidas, saúde, patrimônios e comunidades em um cenário de crescente incerteza climática.
O painel “O papel do setor de seguros na resiliência climática e social” abriu o dia ressaltando o papel do setor de seguros como agente de transformação diante dos impactos crescentes das mudanças climáticas, destacando como ampliar o acesso à proteção e fortalecer a resiliência social no Brasil. Conduzido por Patrícia Freitas, CEO da Prudential, o encontro reuniu Tatiana Assali, sócia da ERM NINT, Mabyr Valderrama, diretora de Sustentabilidade da Fasecolda, Jessica Bastos, diretora da Susep, e Adriana Campelo, diretora regional da UNDRR.
Tatiana Assali apresentou um estudo inédito focado no seguro de vida individual, mostrando que os riscos associados às mudanças climáticas afetam tanto a economia quanto a saúde. O relatório considera dois cenários climáticos: um mais ambicioso, alinhado ao Acordo de Paris, e outro menos ambicioso. No segundo, as projeções apontam para aumento de volatilidade nos mercados financeiros e maior custo operacional para seguradoras.
No caso específico da saúde, eventos extremos como calor intenso já têm impacto sobre a mortalidade. Tatiana citou estudo da The Lancet, que mostra que os custos das mortes relacionadas ao calor chegam a US$ 855 bilhões por ano. O levantamento estima que, até 2050, sinistros por doenças cardiovasculares e câncer podem aumentar em 200%, caso medidas preventivas não sejam adotadas. A solução passa por melhorias em hábitos de vida – prevenção, alimentação, acesso à saúde – com potencial para reduzir em até 65,7% os sinistros por causa dessas doenças.
Regulação como vetor de inclusão e inovação
Jessica Bastos, diretora da Susep, afirmou que a regulação pode acelerar a inovação, mas também represar produtos se mal desenhada. Ela citou a recente revisão da norma de seguro de vida universal, que foi simplificada para facilitar a oferta e o acesso no mercado brasileiro. Também destacou o papel do sandbox regulatório, que permite testar novos modelos de seguro, como produtos intermitentes com pagamento mensal. Jessica lembrou que a Circular 666, que incorpora sustentabilidade à gestão de riscos das seguradoras, cria um ciclo virtuoso no mercado e incentiva práticas ambientais robustas, como no seguro rural.
No campo internacional, coube a Mabyr Valderrama, diretora de Sustentabilidade da Fasecolda, apresentar as principais iniciativas das seguradoras colombianas. Ela destacou a chamada Aliança pela Sustentabilidade do Setor Segurador, que reúne seguradoras para definir uma agenda comum em cinco tópicos: mudanças climáticas, biodiversidade, desastres naturais, inclusão financeira e cibersegurança. Um dos projetos é um guia para infraestrutura verde rodoviária, incentivando seguradoras a exigirem investimentos em soluções naturais ou compensações ambientais em rodovias. Uma curiosidade: na Colômbia, existe exigência legal para que empresas plantem duas árvores por funcionário; a parceria propõe que seguradoras façam parte desse ciclo de compensação em linhas de seguro para transportadoras
Setor privado ainda é ausente na agenda de redução de riscos
Adriana Campelo, coordenadora regional da Agência das Nações Unidas para redução do risco de desastres, classificou a agenda de redução de risco de desastres no Brasil ainda tímida. Segundo ela, a integração entre empresas, seguradoras e cidades ainda está muito distante do necessário diante da escalada dos eventos climáticos extremos e das perdas econômicas associadas. Campelo lembrou que a UNDRR mantém globalmente a rede ARISE, dedicada a mobilizar o setor privado para prevenção e gestão de riscos. Embora consolidada nos Estados Unidos e em vários países latino-americanos, a iniciativa “ainda é muito fraca no Brasil”, afirma.
A falta de engajamento se reflete diretamente no volume insuficiente de recursos disponíveis para ações de prevenção. “Hoje, 75% dos recursos necessários para redução de risco de desastre não têm financiamento. Precisamos trazer o setor privado para trabalhar nisso”, disse.
Adriana também trouxe números do Global Assessment Report, divulgado este ano pela UNDRR, que mostram o descompasso entre os investimentos mundiais em clima e os reais vetores de prevenção. Segundo o relatório, 95% dos recursos globais voltados para desenvolvimento climático vão para mitigação, enquanto apenas 4% são destinados à adaptação. A fatia dedicada diretamente à redução de risco de desastres é ainda menor: menos de 1%.
Menos de 1% dos investimentos vai para redução de risco
Dados da Global Assessment Report, divulgado este ano pela UNDRR, mostram o descompasso entre os investimentos mundiais em clima e os reais vetores de prevenção. Segundo o relatório, 95% dos recursos globais voltados para desenvolvimento climático vão para mitigação, enquanto apenas 4% são destinados à adaptação. A fatia dedicada diretamente à redução de risco de desastres é ainda menor: menos de 1%.
Adriana considera que isso revela uma incompreensão estrutural: “Trabalhar com adaptação climática, com ecossistemas e com biodiversidade é fazer redução de risco. Precisamos integrar essas agendas.”
A moderadora Patricia Freitas reforçou a necessidade de evolução cultural na prevenção e no entendimento do papel dos seguros, citando os impactos recentes no Brasil. Ela lembrou que, somente no Rio Grande do Sul, as perdas associadas às enchentes somam mais de R$ 100 bilhões, dos quais apenas R$ 6 bilhões estavam segurados.
Também destacou a resposta ágil do mercado diante de novos desastres, como o ocorrido no Paraná. Segundo ela, 90 seguradoras participaram de uma chamada emergencial com o regulador no último domingo, demonstrando prontidão mesmo na ausência de seguros paramétricos amplamente difundidos. Para ela, a baixa penetração de seguros no Brasil continua sendo um dos principais entraves à proteção da população e das empresas.
Mudanças climáticas vão pressionar sistemas de saúde
Os eventos climáticos extremos já desafiam os sistemas de saúde brasileiros, com impactos em sua capacidade de atendimento e reflexos nos custos humanos e econômicos. Dessa forma, parcerias público-privadas são indispensáveis para enfrentar o “novo normal” climático, integrando saúde, clima, ciência e proteção financeira. Dados e ciência são o elo central entre políticas públicas, capacidade de resposta e precificação de riscos. Nesse cenário, o setor de seguros é peça-chave na resiliência nacional, não apenas na indenização, mas na prevenção, educação do consumidor e inclusão securitária. Em síntese, essas foram as mensagens chaves extraídas do painel sobre “Clima e saúde — redesenhando o seguro para um futuro sustentável”, que contou com a participação de Goret Pereira Paulo, diretora da Rede de Pesquisa da FGV, Jean Pierre Ometto, pesquisador sênior no INPE, Luciana Dall’Agnol, superintendente de Sustentabilidade da CNseg; e moderação de Gabriela Al-Cici, vice-presidente da Prudential.
Segundo relatório do Banco Mundial citado pela pesquisadora Goret Pereira, cada evento climático extremo reduz entre 25% e 50% a capacidade de atendimento de sistemas de saúde, podendo levar cidades a colapso total, como observado recentemente no Paraná. A recuperação plena pode levar de um a cinco anos, com custos estimados entre US$ 7 bilhões e US$ 37 bilhões apenas na América Latina e Caribe.
Em virtude de eventos climáticos severos, a especialista destacou o risco de aumento das doenças psicossomáticas e de impacto emocional prolongado em populações que perdem casas, renda e referências de futuro. “Esse é um desafio adicional ao SUS, que é um sistema exemplar, mas opera com recursos limitados”, afirmou. Por isso, defendeu fortalecer parcerias com o setor privado — especialmente seguradoras — para complementar a capacidade de resposta.
Outro eixo central de sua fala foi a insuficiência de dados no Brasil. O país ainda carece de medições sistemáticas sobre qualidade do ar, ondas de calor e vulnerabilidade etária, lembrou ela. Em seguida, ela elogiou o lançamento da plataforma da Fiocruz na COP30, que monitora saúde e qualidade do ar na Amazônia, e reforçou que dados climáticos e sanitários são essenciais para a precificação de seguros, o desenho de coberturas e a avaliação da resiliência dos sistemas locais de saúde.
A pesquisadora da FGV destacou, ainda, que esta é a primeira COP com saúde integrada oficialmente à agenda climática, e defendeu uma articulação direta entre municípios, setor segurador e plataformas como o Adapta Clima, para que cidades coletem e compartilhem dados de risco, subsidiando políticas públicas e soluções de proteção financeira.
A ciência como base para decisões sobre risco climático e saúde
Jean Pierre Ometto reforçou que o país já vive “um ambiente climático que a sociedade não conhece”, marcado por eventos intensos, imprevisíveis e que amplificam desigualdades históricas. Ele ressaltou que a ciência hoje fornece indicadores robustos sobre ondas de calor, qualidade do ar, vetores de doenças e vulnerabilidade social — elementos essenciais para decisões tanto de políticas públicas quanto do mercado de seguros.
O pesquisador explicou que plataformas como a ADAPTA Brasil MCTI e estudos da Fiocruz permitem identificar, dentro de uma mesma cidade, bairros mais expostos a calor extremo, enchentes ou deslizamentos, contribuindo para estratégias municipais e modelos de risco das seguradoras.
Ometto detalhou ainda a relação direta entre mudanças climáticas e doenças transmitidas por vetores, como dengue, zika e chikungunya. Com mais calor e umidade, cresce a população de mosquitos infectados e, portanto, o potencial de disseminação. Também citou impactos indiretos, como leptospirose após enchentes e a falta de acesso a unidades de saúde — agravada pelo fato de até 80% dos postos terem sido afetados em alguns eventos recentes. Para ele, o setor de seguros, ao dialogar com a ciência, torna-se um agente multiplicador de cultura de risco, integrando evidências científicas à gestão de proteção, precificação e prevenção.
Superintendente de Sustentabilidade da CNseg, Luciana Dall’Agnol, destacou o papel estratégico do setor de seguros na construção da resiliência climática do país. Ela lembrou que a discussão ultrapassa indivíduos, empresas ou governos: trata-se da capacidade do Brasil de enfrentar, com preparo, os desafios de longo prazo. A seu ver, é fundamental reduzir o gap de proteção no país e ampliar a resiliência social frente à crise climática. Segundo ela, nações com maior penetração de seguros recuperam-se mais rapidamente de desastres, preservando serviços essenciais — saúde, transporte, educação — e reduzindo a dependência do Estado
Nesse sentido, Luciana ressaltou que a compreensão do risco climático e a conscientização da sociedade sobre o “novo normal” são fundamentais. Para ela, o setor segurador demonstra liderança ao reunir diferentes atores para debater como dados confiáveis sustentam decisões de precificação, subscrição, gestão de riscos e comunicação com a população.
Ao ampliar o acesso ao seguro, afirmou Luciana, o país reduz sua lacuna de proteção — fator determinante para a resposta após eventos climáticos extremos. Sociedades mais seguradas recuperam-se mais rapidamente e preservam serviços essenciais, como saúde, mobilidade e educação.
O seguro também diminui a pressão sobre o Estado no processo de reconstrução, permitindo que famílias e empresas retomem suas atividades com maior agilidade e eficiência. Luciana alertou que a baixa proteção securitária tende a elevar o custo do risco, tornando o seguro menos acessível.
Contudo, há um ciclo virtuoso: quanto mais pessoas protegidas, maior é o entendimento sobre risco e preparação, o que reduz perdas e, consequentemente, o custo do seguro. “É por isso que estamos aqui hoje e por isso esta iniciativa foi construída”, afirmou ela, referindo à Casa do Seguro.
O papel estratégico na transição climática foi o fio condutor dos painéis conduzidos pela Prudential na manhã deste sábado (15), na Casa do Seguro — espaço de debates da CNseg na COP30. A avaliação dos participantes é que a inovação em produtos, a regulação e a cooperação internacional são pilares para acelerar essa agenda. Contudo, apesar dos avanços, o setor ainda enfrenta obstáculos, como o limitado financiamento para redução de riscos de desastres, a baixa disseminação da cultura de prevenção, sobretudo entre populações vulneráveis.
Nos debates, os especialistas apontaram que, com melhor governança, uso qualificado de dados e articulação entre governos e iniciativa privada, as seguradoras podem mobilizar capital social e econômico para proteger vidas, saúde, patrimônios e comunidades em um cenário de crescente incerteza climática.
O painel “O papel do setor de seguros na resiliência climática e social” abriu o dia ressaltando o papel do setor de seguros como agente de transformação diante dos impactos crescentes das mudanças climáticas, destacando como ampliar o acesso à proteção e fortalecer a resiliência social no Brasil. Conduzido por Patrícia Freitas, CEO da Prudential, o encontro reuniu Tatiana Assali, sócia da ERM NINT, Mabyr Valderrama, diretora de Sustentabilidade da Fasecolda, Jessica Bastos, diretora da Susep, e Adriana Campelo, diretora regional da UNDRR.
Tatiana Assali apresentou um estudo inédito focado no seguro de vida individual, mostrando que os riscos associados às mudanças climáticas afetam tanto a economia quanto a saúde. O relatório considera dois cenários climáticos: um mais ambicioso, alinhado ao Acordo de Paris, e outro menos ambicioso. No segundo, as projeções apontam para aumento de volatilidade nos mercados financeiros e maior custo operacional para seguradoras.
No caso específico da saúde, eventos extremos como calor intenso já têm impacto sobre a mortalidade. Tatiana citou estudo da The Lancet, que mostra que os custos das mortes relacionadas ao calor chegam a US$ 855 bilhões por ano. O levantamento estima que, até 2050, sinistros por doenças cardiovasculares e câncer podem aumentar em 200%, caso medidas preventivas não sejam adotadas. A solução passa por melhorias em hábitos de vida – prevenção, alimentação, acesso à saúde – com potencial para reduzir em até 65,7% os sinistros por causa dessas doenças.
Regulação como vetor de inclusão e inovação
Jessica Bastos, diretora da Susep, afirmou que a regulação pode acelerar a inovação, mas também represar produtos se mal desenhada. Ela citou a recente revisão da norma de seguro de vida universal, que foi simplificada para facilitar a oferta e o acesso no mercado brasileiro. Também destacou o papel do sandbox regulatório, que permite testar novos modelos de seguro, como produtos intermitentes com pagamento mensal. Jessica lembrou que a Circular 666, que incorpora sustentabilidade à gestão de riscos das seguradoras, cria um ciclo virtuoso no mercado e incentiva práticas ambientais robustas, como no seguro rural.
No campo internacional, coube a Mabyr Valderrama, diretora de Sustentabilidade da Fasecolda, apresentar as principais iniciativas das seguradoras colombianas. Ela destacou a chamada Aliança pela Sustentabilidade do Setor Segurador, que reúne seguradoras para definir uma agenda comum em cinco tópicos: mudanças climáticas, biodiversidade, desastres naturais, inclusão financeira e cibersegurança. Um dos projetos é um guia para infraestrutura verde rodoviária, incentivando seguradoras a exigirem investimentos em soluções naturais ou compensações ambientais em rodovias. Uma curiosidade: na Colômbia, existe exigência legal para que empresas plantem duas árvores por funcionário; a parceria propõe que seguradoras façam parte desse ciclo de compensação em linhas de seguro para transportadoras
Setor privado ainda é ausente na agenda de redução de riscos
Adriana Campelo, coordenadora regional da Agência das Nações Unidas para redução do risco de desastres, classificou a agenda de redução de risco de desastres no Brasil ainda tímida. Segundo ela, a integração entre empresas, seguradoras e cidades ainda está muito distante do necessário diante da escalada dos eventos climáticos extremos e das perdas econômicas associadas. Campelo lembrou que a UNDRR mantém globalmente a rede ARISE, dedicada a mobilizar o setor privado para prevenção e gestão de riscos. Embora consolidada nos Estados Unidos e em vários países latino-americanos, a iniciativa “ainda é muito fraca no Brasil”, afirma.
A falta de engajamento se reflete diretamente no volume insuficiente de recursos disponíveis para ações de prevenção. “Hoje, 75% dos recursos necessários para redução de risco de desastre não têm financiamento. Precisamos trazer o setor privado para trabalhar nisso”, disse.
Adriana também trouxe números do Global Assessment Report, divulgado este ano pela UNDRR, que mostram o descompasso entre os investimentos mundiais em clima e os reais vetores de prevenção. Segundo o relatório, 95% dos recursos globais voltados para desenvolvimento climático vão para mitigação, enquanto apenas 4% são destinados à adaptação. A fatia dedicada diretamente à redução de risco de desastres é ainda menor: menos de 1%.
Menos de 1% dos investimentos vai para redução de risco
Dados da Global Assessment Report, divulgado este ano pela UNDRR, mostram o descompasso entre os investimentos mundiais em clima e os reais vetores de prevenção. Segundo o relatório, 95% dos recursos globais voltados para desenvolvimento climático vão para mitigação, enquanto apenas 4% são destinados à adaptação. A fatia dedicada diretamente à redução de risco de desastres é ainda menor: menos de 1%.
Adriana considera que isso revela uma incompreensão estrutural: “Trabalhar com adaptação climática, com ecossistemas e com biodiversidade é fazer redução de risco. Precisamos integrar essas agendas.”
A moderadora Patricia Freitas reforçou a necessidade de evolução cultural na prevenção e no entendimento do papel dos seguros, citando os impactos recentes no Brasil. Ela lembrou que, somente no Rio Grande do Sul, as perdas associadas às enchentes somam mais de R$ 100 bilhões, dos quais apenas R$ 6 bilhões estavam segurados.
Também destacou a resposta ágil do mercado diante de novos desastres, como o ocorrido no Paraná. Segundo ela, 90 seguradoras participaram de uma chamada emergencial com o regulador no último domingo, demonstrando prontidão mesmo na ausência de seguros paramétricos amplamente difundidos. Para ela, a baixa penetração de seguros no Brasil continua sendo um dos principais entraves à proteção da população e das empresas.
Mudanças climáticas vão pressionar sistemas de saúde
Os eventos climáticos extremos já desafiam os sistemas de saúde brasileiros, com impactos em sua capacidade de atendimento e reflexos nos custos humanos e econômicos. Dessa forma, parcerias público-privadas são indispensáveis para enfrentar o “novo normal” climático, integrando saúde, clima, ciência e proteção financeira. Dados e ciência são o elo central entre políticas públicas, capacidade de resposta e precificação de riscos. Nesse cenário, o setor de seguros é peça-chave na resiliência nacional, não apenas na indenização, mas na prevenção, educação do consumidor e inclusão securitária. Em síntese, essas foram as mensagens chaves extraídas do painel sobre “Clima e saúde — redesenhando o seguro para um futuro sustentável”, que contou com a participação de Goret Pereira Paulo, diretora da Rede de Pesquisa da FGV, Jean Pierre Ometto, pesquisador sênior no INPE, Luciana Dall’Agnol, superintendente de Sustentabilidade da CNseg; e moderação de Gabriela Al-Cici, vice-presidente da Prudential.
Segundo relatório do Banco Mundial citado pela pesquisadora Goret Pereira, cada evento climático extremo reduz entre 25% e 50% a capacidade de atendimento de sistemas de saúde, podendo levar cidades a colapso total, como observado recentemente no Paraná. A recuperação plena pode levar de um a cinco anos, com custos estimados entre US$ 7 bilhões e US$ 37 bilhões apenas na América Latina e Caribe.
Em virtude de eventos climáticos severos, a especialista destacou o risco de aumento das doenças psicossomáticas e de impacto emocional prolongado em populações que perdem casas, renda e referências de futuro. “Esse é um desafio adicional ao SUS, que é um sistema exemplar, mas opera com recursos limitados”, afirmou. Por isso, defendeu fortalecer parcerias com o setor privado — especialmente seguradoras — para complementar a capacidade de resposta.
Outro eixo central de sua fala foi a insuficiência de dados no Brasil. O país ainda carece de medições sistemáticas sobre qualidade do ar, ondas de calor e vulnerabilidade etária, lembrou ela. Em seguida, ela elogiou o lançamento da plataforma da Fiocruz na COP30, que monitora saúde e qualidade do ar na Amazônia, e reforçou que dados climáticos e sanitários são essenciais para a precificação de seguros, o desenho de coberturas e a avaliação da resiliência dos sistemas locais de saúde.
A pesquisadora da FGV destacou, ainda, que esta é a primeira COP com saúde integrada oficialmente à agenda climática, e defendeu uma articulação direta entre municípios, setor segurador e plataformas como o Adapta Clima, para que cidades coletem e compartilhem dados de risco, subsidiando políticas públicas e soluções de proteção financeira.
A ciência como base para decisões sobre risco climático e saúde
Jean Pierre Ometto reforçou que o país já vive “um ambiente climático que a sociedade não conhece”, marcado por eventos intensos, imprevisíveis e que amplificam desigualdades históricas. Ele ressaltou que a ciência hoje fornece indicadores robustos sobre ondas de calor, qualidade do ar, vetores de doenças e vulnerabilidade social — elementos essenciais para decisões tanto de políticas públicas quanto do mercado de seguros.
O pesquisador explicou que plataformas como a ADAPTA Brasil MCTI e estudos da Fiocruz permitem identificar, dentro de uma mesma cidade, bairros mais expostos a calor extremo, enchentes ou deslizamentos, contribuindo para estratégias municipais e modelos de risco das seguradoras.
Ometto detalhou ainda a relação direta entre mudanças climáticas e doenças transmitidas por vetores, como dengue, zika e chikungunya. Com mais calor e umidade, cresce a população de mosquitos infectados e, portanto, o potencial de disseminação. Também citou impactos indiretos, como leptospirose após enchentes e a falta de acesso a unidades de saúde — agravada pelo fato de até 80% dos postos terem sido afetados em alguns eventos recentes. Para ele, o setor de seguros, ao dialogar com a ciência, torna-se um agente multiplicador de cultura de risco, integrando evidências científicas à gestão de proteção, precificação e prevenção.
Superintendente de Sustentabilidade da CNseg, Luciana Dall’Agnol, destacou o papel estratégico do setor de seguros na construção da resiliência climática do país. Ela lembrou que a discussão ultrapassa indivíduos, empresas ou governos: trata-se da capacidade do Brasil de enfrentar, com preparo, os desafios de longo prazo. A seu ver, é fundamental reduzir o gap de proteção no país e ampliar a resiliência social frente à crise climática. Segundo ela, nações com maior penetração de seguros recuperam-se mais rapidamente de desastres, preservando serviços essenciais — saúde, transporte, educação — e reduzindo a dependência do Estado
Nesse sentido, Luciana ressaltou que a compreensão do risco climático e a conscientização da sociedade sobre o “novo normal” são fundamentais. Para ela, o setor segurador demonstra liderança ao reunir diferentes atores para debater como dados confiáveis sustentam decisões de precificação, subscrição, gestão de riscos e comunicação com a população.
Ao ampliar o acesso ao seguro, afirmou Luciana, o país reduz sua lacuna de proteção — fator determinante para a resposta após eventos climáticos extremos. Sociedades mais seguradas recuperam-se mais rapidamente e preservam serviços essenciais, como saúde, mobilidade e educação.
O seguro também diminui a pressão sobre o Estado no processo de reconstrução, permitindo que famílias e empresas retomem suas atividades com maior agilidade e eficiência. Luciana alertou que a baixa proteção securitária tende a elevar o custo do risco, tornando o seguro menos acessível.
Contudo, há um ciclo virtuoso: quanto mais pessoas protegidas, maior é o entendimento sobre risco e preparação, o que reduz perdas e, consequentemente, o custo do seguro. “É por isso que estamos aqui hoje e por isso esta iniciativa foi construída”, afirmou ela, referindo à Casa do Seguro.
Descarbonização do Agro: o que é, como funciona e por que já transforma o campo brasileiro
A descarbonização do agro é o conjunto de práticas, tecnologias e modelos produtivos que reduzem as emissões de gases de efeito estufa (CO₂, metano e óxido nitroso) sem perder eficiência e, muitas vezes, aumentando a produtividade. No Brasil, esse movimento já é realidade e está diretamente ligado às metas climáticas discutidas na COP30
Pastagens degradadas: o maior potencial de recuperação do mundo
O país possui 28 milhões de hectares de pastagens degradadas. Recuperá-las é uma das soluções mais rápidas e baratas para cortar emissões.
- Mais de 4 milhões de hectares já foram restaurados, especialmente no Centro-Oeste e Sudeste
- No Mato Grosso do Sul, 4,7 milhões de hectares fazem parte de políticas estruturadas de recuperação e aumento de vigor produtivo
Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) em expansão acelerada
Sistemas integrados cresceram 52% em cinco anos, chegando a 18 milhões de hectares.
A meta brasileira é alcançar 35 milhões de hectares até 2030, combinando agricultura, pecuária e árvores para estocar carbono, melhorar o solo e reduzir emissões da pecuária.
Crédito rural sustentável e financiamento verde
As CPRs verdes cresceram 31% entre julho e outubro de 2025, movimentando R$ 86 bilhões para práticas sustentáveis, bioinsumos e industrialização de cadeias de baixo carbono.
O cooperativismo de crédito ampliou o acesso: foram R$ 55 bilhões em linhas verdes para 600 mil produtores.
Tecnologia digital e monitoramento ambiental
Drones, sensores e softwares já monitoram carbono, água, nutrientes e rastreabilidade.
Ferramentas como RenovaCalc e CPBC (Embrapa) mostram que:
- áreas bem manejadas têm até 30% mais produtividade
- conseguem reduzir emissões diretas
- estocar até 6 toneladas de carbono/hectare/ano
Impacto econômico e competitividade internacional
A agricultura de baixo carbono movimentou US$ 10 bilhões em 2025, beneficiando mais de 1.000 produtores em projetos-piloto.
Estimativas da FGV Agro indicam potencial adicional de R$ 94,8 bilhões ao PIB por ano até 2030.
Queda histórica nas emissões do agro
Em 2024, o setor alcançou a maior redução em 16 anos:
- –16,7% nas emissões, graças à recuperação de pastagens, sistemas integrados, manejo eficiente e tecnologias digitais
- Na pecuária, técnicas já disponíveis permitem reduzir até 79,9% das emissões, chegando a 92% com manejo avançado
Por que a descarbonização do agro importa?
A transição do campo brasileiro já garante:
- menos desmatamento e mais recuperação de áreas
- mais produtividade com menos impacto
- Mais renda para pequenos e médios produtores
- maior valor agregado aos alimentos brasileiros
- competitividade global e alinhamento às metas climáticas
O agro nacional mostra, com dados e tecnologia, que é possível produzir mais, emitir menos e construir um modelo de agricultura capaz de liderar a transição para uma economia de baixo carbono
Descarbonização do agro avança, mas falta de financiamento ainda freia transição verde

Mantido o ritmo atual e sem medidas voltadas à descarbonização, o agronegócio brasileiro poderá quase dobrar suas emissões de gases de efeito estufa, saindo de 480 milhões de toneladas de CO₂ em 2023 para quase 800 milhões em 2050. O alerta foi feito durante o painel “Descarbonização do Agronegócio: caminhos para reduzir emissões e promover a sustentabilidade”, organizado pela Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) e pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban). O debate ocorreu neste sábado, na Casa do Seguro, espaço de discussões da CNseg na COP30.
Moderadora do painel, Alessandra Fajardo, diretora executiva do CEBDS, destacou que a transição climática do agronegócio brasileiro ganhou nova força com a formação de uma ampla coalizão setorial dedicada à descarbonização. Essa iniciativa reúne mais de 40 organizações de toda a cadeia do agro e busca acelerar a adoção de práticas regenerativas no campo, reduzir emissões e viabilizar investimentos necessários para transformar a produção até 2050.
Segundo Alessandra, a coalizão foi viabilizada por sete entidades em colaboração com grandes empresas do setor — CEBDS, Amaggi, Nestlé, Tereos, Syngenta, Bayer e Citrosuco — e se diferencia por não ter sido construída “em caixinhas”, como iniciativas anteriores. Ela integra elos da cadeia que raramente atuam juntos: associações, indústria de insumos, traders, grandes fabricantes de alimentos, bancos e outros setores estratégicos.
Reconhecendo que o quadro é desafiador, ela disse ser possível reduzir entre 70% e 80% das emissões do setor até 2050. Essa transição é, contudo, onerosa, custando entre US$ 70 bilhões e US$ 120 bilhões. A chamada agricultura regenerativa é viável, rentável e já tem histórico de sucesso. Isso porque não apenas reduz emissões como aumenta a rentabilidade das propriedades rurais.
Gap de US$ 100 bilhões: o grande desafio do financiamento climático
A especialista destacou que, embora o agro já conte com diversas linhas de crédito verdes, elas não são suficientes para sustentar a transformação necessária.“Temos muitos mecanismos, mas falta escala.”
Dos até US$ 170 bilhões requeridos, o sistema atual cobre uma parcela limitada, deixando um gap de US$ 100 bilhões. Para preencher essa lacuna, será preciso ampliar o uso de blended finance e atrair capital catalítico que tornará a transição acessível a produtores de diferentes portes.
Outros pontos considerados essenciais:
- Maior suporte técnico direto aos produtores, especialmente na fase inicial da transição;
- Impulsionar P&D e novas tecnologias;
- Mobilizar capital para práticas regenerativas já comprovadas.
Alessandra reforçou que as quatro principais alavancas que respondem por 80% do potencial de redução já são conhecidas: plantio direto, sistemas integrados lavoura-pecuária, intensificação animal e cultivos de cobertura.
Os passos dados pela Amaggi
Juliana de Lavor Lopes, diretora de ESG da Amaggi, afirmou que o agronegócio brasileiro já percorreu um caminho significativo rumo à redução de emissões – muitas vezes sem ter plena consciência disso. Nesse sentido, ela relatou que a principal surpresa de um estudo conduzido em parceria com entidades do setor foi constatar que quatro ou cinco alavancas são capazes de responder por até 80% da mitigação necessária. “Quando vimos que poucas alavancas reduziam 80% das emissões, foi um espanto. Mostra o quanto já inovamos, mesmo quando não era esse o foco”, afirmou.
Segundo Juliana, práticas que inicialmente não tinham a descarbonização como objetivo acabaram contribuindo decisivamente para conter emissões ao longo das últimas décadas. Sem elas, os números seriam muito mais elevados. Essa constatação revela, segundo a executiva, dois pontos essenciais: o setor já tem um histórico consistente de inovação; e poucos setores econômicos alcançariam tamanha redução com técnicas já conhecidas.
Desafio agora é calcular, medir e transformar
Apesar do avanço, Juliana reforçou a necessidade urgente de precisão metodológica para mensurar emissões e registrar ganhos de forma padronizada. “Precisamos saber calcular melhor, transformar em dados quantificáveis.”
Essa etapa, de acordo com ela, é indispensável para dar segurança a produtores, compradores e investidores e para viabilizar mecanismos financeiros de apoio à transição.
Juliana explicou que, para a Amaggi, os resultados do estudo trouxeram clareza estratégica. A empresa possui compromissos de desmatamento zero e conversão zero na cadeia de valor, o que significa crescer apenas em áreas já abertas. “O estudo mostra que o crescimento está justamente na integração lavoura-pecuária e nas áreas abertas com plantio. Isso, para mim, é música.”
Vale lembrar que a companhia administra uma das maiores cadeias produtivas do país, com 6.000 produtores, 9.000 fazendas e 22 milhões de hectares monitorados diariamente. Essa escala, porém, também representa um enorme desafio de padronização e de inclusão produtiva. A transição, no caso da empresa, não é de pecuária para lavoura, mas de agricultura convencional para agricultura regenerativa — um movimento que exige investimentos e implica riscos.
A experiência da Citrosuco
Leon Cruz, especialista ESG da Citrosuco, relatou os avanços da empresa no campo da agricultura regenerativa. A Citrosuco — maior processadora de suco de laranja do mundo, responsável por quatro de cada dez copos consumidos globalmente — vive um momento de extremos: após a pior safra em 30 anos, caminha para a melhor dos últimos 10. Segundo Leon Cruz, a companhia enfrenta dois desafios centrais: instabilidade climática, que afeta o desenvolvimento da fruta, e o greening, doença que já comprometeu 40% dos pomares do país.
Para aumentar a resiliência, a empresa adotou a agricultura regenerativa como estratégia central e certificou 100% de suas fazendas. Estudos da Embrapa mostraram que pomares de laranja capturam mais CO₂ que outras culturas, o que levou à criação do PSA Carbono Agro, programa que remunera práticas sustentáveis em toda a cadeia — 60% da produção da empresa vem de parceiros.
Desenvolvido com a ECCON e a Reservas Votorantim, o projeto está em fase piloto em quatro fazendas e avança para cooperativas e pequenos produtores, que representam 20% da cadeia. A iniciativa teve um marco importante com a primeira venda de créditos de carbono, reforçando a integridade da metodologia. “Estamos no início, mas com potencial de transformar toda a cadeia produtiva”, afirmou Cruz.
Respostas do mercado segurador à agricultura regenerativa
Em resposta sobre como o mercado segurador poderá apoiar a transição para uma agricultura regenerativa, Pedro Werneck, gerente de Sustentabilidade da CNseg, afirmou que nenhum outro setor tem a competência para avaliar e precificar riscos como o de seguros, destacando três frentes de atuação.
A primeira é a proteção, tendo em vista que seguro permite aos produtores se recompor de perdas de safra, dando-lhes tranquilidade para usar suas reservas em investimentos, inovação e práticas sustentáveis, como a agricultura regenerativa, em vez de guardá-las para cobrir perdas.
A segunda esfera é a indução. Isso porque as seguradoras podem privilegiar práticas sustentáveis refletindo isso no preço, pois entendem que isso reduz o risco climático a longo prazo. Isso cria um efeito cascata na economia, gerando valor para a descarbonização.
A terceira é a viabilização de investimentos. Ele lembrou que o agro é um setor crítico para a descarbonização do Brasil e requer investimentos em novos processos e tecnologias. O setor de seguros pode reduzir o custo de capital para esses investimentos e facilitar o acesso a crédito, diminuindo o risco percebido pelas instituições financeiras. O agronegócio é extremamente vulnerável às mudanças climáticas, mas também é relevante para o crescimento nacional e a segurança alimentar global. Portanto, um olhar atento dos instrumentos financeiros é fundamental.
Dificuldades de financiamento da transição de pequenos produtores
De acordo com o gerente de Sustentabilidade e Inovação da Anbima, Luiz Pires, o mercado de capitais tem ampliado o financiamento ao agro nos últimos anos, mas enfrenta o desafio de fazer recursos chegarem à ponta do sistema. Na sua avaliação, o avanço dos Fiagros tem ampliado o acesso a capital de longo prazo no agronegócio, trazendo “dinheiro mais rápido e mais barato”, capaz de sustentar transformações estruturais no campo. Segundo Pires, o mercado de capitais não rejeita risco, mas exige retornos proporcionais e, sobretudo, informação confiável.
Para isso, crescem estruturas de governança, padronização e títulos rotulados, como os verdes, que passam por auditorias independentes e aumentam a confiança do investidor institucional. A recente taxonomia sustentável brasileira também ajuda a orientar o fluxo de capital para projetos que geram impacto ambiental positivo.
O grande desafio, afirma, é fazer com que esses recursos cheguem ao pequeno produtor — “a Dona Maria e o Seu José”. A solução passa por ecossistemas de investimento, combinando bancos, gestores, governo e instrumentos de blended finance para distribuir riscos e viabilizar operações na ponta. Com mais dados sobre carbono e biodiversidade, diz, será possível financiar de forma ainda mais estruturada. Nos últimos anos, essa capacidade de financiamento tem crescido de forma consistente, concluiu
Bancos avançam em critérios climáticos
A relação do setor bancário com o risco socioambiental no agronegócio não é nova. Como lembra Cintia Oller Cespedes, gerente de Sustentabilidade da Febraban, a primeira norma do Banco Central sobre o tema, ainda em 2008, já tinha o agro como foco. Hoje, critérios climáticos fazem parte do próprio manual do crédito rural, consolidando a pauta no sistema financeiro.
O grande desafio, afirma ela, está na qualidade e na disponibilidade de dados — especialmente quando se trata de pequenos produtores. “Com grandes empresas como Amaggi e Citrosuco, que já reportam emissões e têm métricas consolidadas, é mais fácil. Mas e os pequenos?”, questiona.
Para enfrentar essa lacuna, a Febraban trabalha na criação de uma base setorial de emissões e na elaboração de um roadmap para gestão de riscos de desmatamento, permitindo que bancos se antecipem e identifiquem oportunidades além das exigências regulatórias. Cespedes destaca ainda iniciativas como o Eco Invest, que combina capital catalítico e blended finance para acelerar investimentos sustentáveis. “O problema não é o risco ser alto; é ele ser desconhecido”, resume. “Precisamos trabalhar juntos — bancos, empresas, governo e academia - para medir, entender e reduzir esse risco.”
CNseg reforça agenda climática na COP30 com participação em três painéis sobre seguros, resiliência urbana e cooperativismo climático

- As superintendentes Luciana Dall’Agnol (Sustentabilidade) e Marianah Vilela (Relações Institucionais), ao lado do superintendente executivo Gustavo Brum, representaram a CNseg em três debates realizados no Pavilhão Pará - Green Zone da COP30, em Belém, reforçando o protagonismo do setor segurador na adaptação climática e na construção de resiliência econômica e social no Brasil
Seguros e Inteligência Climática para uma Transição Justa
No painel que discutiu a integração entre seguradoras, inteligência climática e políticas de transição justa, Luciana Dall’Agnol moderou o debate e destacou a urgência de ampliar a cultura de gestão de riscos no Brasil, especialmente frente ao aumento dos eventos climáticos extremos.
“O setor de seguros é especialista na prevenção e na mitigação de riscos. Precisamos difundir essa mentalidade e promover soluções que unam longevidade e sustentabilidade” - Luciana Dall’Agnol
Edson Franco, presidente da FenaPrevi, reforçou a conexão entre envelhecimento populacional, proteção familiar e sustentabilidade econômica, ressaltando o papel do seguro como mecanismo de transferência de riscos para toda a sociedade.
O painel discutiu ainda os avanços da previdência complementar sustentável, novos produtos orientados à adaptação climática e a utilização do Hub de Inteligência Climática da CNseg para modelagens de risco e prevenção.
Cidades Resilientes: Finanças, Seguros e Políticas para Enfrentamento de Catástrofes
No debate promovido pela FGV, Marianah Vilela destacou a atuação estratégica das seguradoras em políticas públicas de gestão de riscos e resiliência urbana. O painel avançou sobre caminhos para integrar finanças sustentáveis, seguro e infraestrutura adaptada ao clima.
“A atuação do setor envolve iniciativas como o Seguro Social de Catástrofes, o Hub de Inteligência Climática para Seguros e a reestruturação do Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil (Funcap), todos voltados ao fortalecimento da gestão de riscos e à resposta às mudanças climáticas” - Marianah Vilela
A discussão abordou ainda desafios em regiões vulneráveis, integração de dados climáticos, estratégias de prevenção e a necessidade de ampliar a proteção securitária diante de secas, enchentes e deslizamentos.
Cooperativismo e Resiliência Climática
No painel da OCB, Gustavo Brum apresentou a contribuição do setor segurador no fortalecimento socioeconômico do país, conectando cooperativismo de crédito, agricultura sustentável e instrumentos de proteção ao produtor rural.
O debate tratou do papel das cooperativas na redução de vulnerabilidades, na expansão dos seguros rurais e no apoio às comunidades impactadas por mudanças climáticas, especialmente na Amazônia Legal e no Nordeste.
Fonte: CNseg, em 15.11.2025