
Estudo do Ipea e da ANM revela que o país concentra até 19% das reservas mundiais de terras raras e volumes comparáveis aos da China em grafita, mas vê produção cair enquanto o mundo acelera para abastecer carros elétricos, energia solar e eólica.
O Brasil reúne condições geológicas para ocupar posição central na nova economia verde, mas há sinais de que está perdendo a corrida global pelos minerais críticos da transição energética. O assunto, tema de capa da edição nº 933 da Revista de Seguros (https://revistadeseguros.cnseg.org.br/revistas/933-abr-mai-jun-2025/), agora é abordado em estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), elaborado em parceria com a Agência Nacional de Mineração (ANM). O estudo examinou reservas, produção, comércio exterior e investimentos em dez minerais essenciais para tecnologias de baixo carbono, como veículos elétricos, turbinas eólicas e painéis solares.
Os dados obtidos escancaram um paradoxo. O país abriga cerca de 74 milhões de toneladas de grafita, volume próximo ao da China, líder mundial. Detém ainda 19% das reservas globais de terras raras, ficando atrás apenas de China e Vietnã — minerais indispensáveis para motores elétricos e equipamentos de geração renovável. No manganês, o Brasil é o terceiro maior detentor de reservas do mundo; no níquel, o quarto; e responde por 9% da bauxita, base da indústria do alumínio.
Produção em sentido oposta à demanda global
Apesar da abundância, a produção nacional marcha em direção oposta à demanda global. Nos últimos sete anos, enquanto o mundo ampliou a extração para sustentar a transição energética, o Brasil reduziu de forma consistente sua oferta. A produção de grafita caiu, em média, 8,4% ao ano, contra crescimento global de 10%. No manganês, a retração foi de 7,4% ao ano. Já nas terras raras, o recuo médio anual chegou a 6,4%, em contraste com uma expansão mundial superior a 19%.
“O Brasil tem reservas comparáveis às dos principais produtores, mas não converte esse potencial em produção. O país está fora da dinâmica global que impulsiona a mineração voltada à descarbonização”, afirma Rafael da Silveira Soares Leão, um dos autores do estudo.
Energia verde muda a geopolítica global
A corrida pelos minerais da nova energia está no radar da transformação estrutural dos sistemas energéticos. Essas tecnologias limpas demandam muito mais insumos minerais do que as soluções fósseis tradicionais. Um carro a combustão utiliza menos de 50 quilos desses materiais; um veículo elétrico pode exigir mais de 200 quilos de cobre, níquel, lítio, grafita e terras raras. Na geração elétrica, a diferença é ainda mais expressiva: uma turbina eólica offshore pode requerer até 16 toneladas de minerais por megawatt instalado, enquanto um painel solar demanda mais de sete toneladas.
Isso promove uma mudança na geopolítica global. No lugar do petróleo, ganham protagonismo países capazes de assegurar oferta estável de minerais críticos. A China, que percebeu esse movimento ainda nos anos 1990, construiu uma hegemonia não apenas na extração, mas principalmente nas etapas de maior valor agregado. Hoje, controla 95% do refino de grafita, 91% das terras raras e do manganês, 78% do cobalto e 70% do lítio. No elo final, a liderança é ainda mais clara: 85% das baterias para veículos elétricos são produzidas em território chinês.
“Países que garantem acesso barato e previsível a minerais críticos saem na frente no desenvolvimento de tecnologias renováveis. Isso vale tanto para grandes produtores quanto para importadores com forte poder de barganha”, observa Leão.
Exportações nacionais são de baixo valor agregado
Nesse cenário, o Brasil aparece como uma potência geológica com desempenho tímido na produção e quase irrelevante no refino e na indústria de transformação mineral. O resultado é uma posição frágil: exportador de minérios brutos de baixo valor agregado e importador caro de equipamentos e tecnologias verdes.
A principal exceção recente é o lítio do Vale do Jequitinhonha, cuja produção cresceu, em média, 75% ao ano, elevando o país à sexta posição no ranking global. Ainda assim, o avanço é insuficiente para inserir o Brasil de forma robusta na cadeia global de baterias.
Isso porque, enquanto a produção doméstica recua, cresce a dependência de minerais já processados, essenciais para a indústria nacional. Para os pesquisadores, isso evidencia perda de competitividade e ausência de uma estratégia integrada entre política mineral, industrial e energética, descreve o estudo. “Sem investimentos em exploração, pesquisa geológica e capacidade industrial, manter grandes reservas não será suficiente para garantir espaço na economia verde”, alerta Leão.
Investir já ou perder a janela de oportunidades
É imperativo acelerar os investimentos, diz o estudo, ao destacar que as janelas que começam a se fechar. Mesmo com sinais pontuais de recuperação da produção em 2023 — especialmente em cobre, manganês, zinco e lítio —, o estudo conclui que o ritmo ainda está longe do necessário. A transição energética avança rapidamente e tende a concentrar cadeias produtivas nos próximos anos.
Para transformar potencial em protagonismo, o Brasil precisará agir de forma imediata: reduzir incertezas regulatórias, ampliar investimentos em prospecção, fortalecer a fiscalização ambiental, modernizar a infraestrutura logística e estimular a indústria de transformação mineral. “Estamos diante de uma mudança estrutural que não se repetirá. As decisões tomadas agora vão definir quem liderará a economia verde nas próximas décadas. O Brasil tem condições de estar entre os protagonistas, mas só será se agir”, conclui o pesquisador
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Fonte: CNseg, em 15.12.2025