Por Antonio Penteado Mendonça
Se nas férias as seguradoras pagam mais indenizações do que no resto do ano, no carnaval os acidentes aumentam mais ainda. A razão é óbvia: se nas férias as pessoas relaxam, tentando se vingar do ano que passou, no carnaval elas querem ação, e ação com riscos maiores do que a rotina de suas vidas.
Os que saem para pular o carnaval, nas ruas ou nos bailes, vão dispostos a ficar leves, livres e soltos, ou seja, normalmente não enjeitam a cerveja gelada, ou o gole de gim tônica, ou de qualquer outra bebida para espantar o calor sem tirar a animação.
Muitos acreditam que álcool não atrapalha o dirigir, nem tira a concentração e os reflexos, e vão de carro, porque pra voltar, de madrugada, é mais fácil do que procurar taxi. O resultado é que os postes e as árvores se transformam em obstáculos a serem vencidos, invariavelmente com o carro amassado, quando não com gente ferida, polícia, ambulância e a sirene ligada no rumo do hospital.
Outros, por uma razão ou outra, resolvem ficar valentes e fazem o que não costumam fazer, seja graça para a mulher ao lado, seja pisar no pé de quem lhe deu uma cotovelada. A briga estoura, a pancadaria cresce e uma garrafada na cabeça deixa de ser uma possibilidade remota para se transformar em cachoeira de sangue, escorrendo pela cara, sujando a camisa, acabando no pronto-socorro.
E tem aquele que não tem nada com isso, não bebeu, não brigou, não foi a baile, nem saiu em bloco de rua, mas que está no lugar errado, na hora errada. Quando dá por si, o carro foi violentamente chacoalhado por outro carro dirigido por um bêbado, que bate, amassa e o joga de encontro a outro veículo que também não tem nada com isso e vem na mão certa, pela pista contrária, causando a colisão frontal, com pessoas machucadas que não fizeram nada errado para se machucar.
Tem também quem não gosta da folia e decide viajar para um hotel fazenda onde pretende passar os feriados descansando, fora da rotina estafante, para carregar as baterias para enfrentar o ano complicado que terá pela frente.
Nunca montou a cavalo, nunca guiou uma charrete, nunca fez rapel, nunca desceu rio sentado em pneu, mas por que não? Sair da rotina é isso. Entregar a alma a Deus e encostar no barranco da estrada pra ver a vida passar. O problema é que esportes radicais não são a mesma coisa que, depois do almoço, deitar numa rede debaixo das jabuticabeiras e dormir o sono dos justos, de barriga cheia e coração satisfeito.
Cair do cavalo pode custar uma perna ou um braço quebrado, a charrete virar pode ser ainda mais grave, para não falar nos danos de um tombo de boia numa corredeira rápida ou as consequências de se desequilibrar e perder o controle da corda na descida do rapel.
Cada um sabe de si e algumas dessas situações podem ficar sem indenização de seguro, em função do segurado perder o direito a ela por estar de cara cheia, fazer deliberadamente algo proibido ou dar margem a outras situações previstas na apólice.
Mas a regra é o pagamento. Quer porque o segurado não agrava o risco, quer porque a lei determina que a indenização seja paga, tanto faz a causa do acidente. Por exemplo, no acidente causado pelo motorista bêbado que bate em outro carro que passa pelo local, ainda que o seguro do bêbado não pague a indenização, o seguro do motorista que estava na hora errada, no lugar errado, não tem razão para negar a indenização do seu segurado. Da mesma forma que o seguro de vida e acidentes pessoais não pode negar a indenização alegando agravação de risco pela prática de esporte radical, ou que o segurado não era habilitado a dirigir charrete ou andar a cavalo.
E o quadro se agrava quando o contrato acionado é o plano de saúde privado. No carnaval, com certeza, a sua utilização aumenta bem. E, ainda que o aumento do uso por mais gente ao mesmo tempo não ameace a solidez do plano, a demanda maior indica que muita gente pode ter se acidentado gravemente.
Quer dizer, entre mortos e feridos, as seguradoras e as operadoras dos planos de saúde privados não ficam ameaçadas, mas seus segurados correm riscos muito altos em função de suas decisões em quatro dias de feriados.
Fonte: SindSegSP, em 05.02.2016.