
A informalidade do trabalho é um dos maiores desafios sociais e econômicos da América Latina. Mas seus efeitos não terminam no presente: ela também compromete o futuro previdenciário de milhões de pessoas. Em países onde a aposentadoria depende de poupança acumulada ao longo da vida — como nos sistemas de capitalização— o emprego informal tem um impacto direto e devastador: ele interrompe ou impede contribuições e reduz dramaticamente o benefício final.
A lógica é simples. Em regimes de capitalização, a renda na velhice depende de três fatores: quanto se contribui, por quanto tempo se contribui e por quantos anos esse saldo precisa financiar a aposentadoria. A informalidade ataca o núcleo do modelo ao cortar a densidade contributiva, isto é, o número de anos efetivamente contribuídos. Menos tempo contribuindo significa menos capital acumulado e, sobretudo, menos tempo para os juros compostos atuarem — o principal motor de crescimento das reservas previdenciárias.
Simulações em países latino-americanos com sistemas de poupança individual mostram a dimensão do problema. Só elevar a densidade de contribuição a níveis próximos aos europeus geraria aumentos expressivos nas taxas de reposição — a pensão como proporção do salário final. Quando esse ganho é combinado com alíquotas mais realistas e idade de aposentadoria compatível com a longevidade, o salto se torna ainda maior. A mensagem é cristalina: regularidade contributiva importa tanto quanto a alíquota. Sem contribuições contínuas, nem o melhor retorno de investimento consegue compensar o vazio acumulado ao longo da carreira.
O efeito é ainda mais grave entre os jovens. A entrada tardia no mercado formal e a alternância entre informalidade e desemprego fazem com que lacunas ocorram justamente nos anos mais valiosos para acumular poupança. Não contribuir nos primeiros anos de trabalho custa caro porque elimina a fase em que cada aporte teria mais tempo para render. Em outras palavras: a aposentadoria começa a ser definida cedo; adiar contribuições hoje é reduzir renda amanhã.
Para o Brasil e para o setor de previdência complementar, o debate tem duas implicações estratégicas. A primeira é que a formalização do trabalho não é apenas uma agenda trabalhista ou fiscal — é política previdenciária. Ela amplia a base contributiva, sustenta a poupança de longo prazo e melhora as aposentadorias futuras. A segunda é que, enquanto a informalidade persistir, será preciso inovar: planos acessíveis, contribuições flexíveis, portabilidade simples e adesão digital podem criar trajetórias de poupança mesmo em carreiras instáveis.
Em síntese, não há como elevar o patamar das aposentadorias sem enfrentar a informalidade e sem estimular contribuições precoces e contínuas. O juro composto é o maior aliado do trabalhador — mas só funciona quando há contribuição. A informalidade cria um “buraco invisível” no ciclo de vida previdenciário. Fechá-lo é condição para garantir renda digna na velhice e ampliar a força da previdência complementar como instrumento de proteção social e desenvolvimento econômico.
*Devanir Silva é Diretor-Presidente da Abrapp
Fonte: Abrapp em Foco, em 09.12.2025.