
Nos últimos anos, morando fora do Brasil – já faz quase uma década –, fui percebendo uma diferença marcante na forma como a Europa encara o envelhecimento. Aqui, a pirâmide demográfica já virou: mais de um terço da população tem mais de 60 anos, e a ideia de “ficar velho” acontece muito mais tarde do que no Brasil. As pessoas vivem mais, trabalham mais tempo e continuam ativas de outras formas. Isso muda completamente o modo como a sociedade entende o valor da experiência e da longevidade produtiva.
Ao mesmo tempo, acompanhando de perto os avanços das ciências da vida, percebi que estamos muito próximos de um ponto de inflexão. Pesquisadores de diferentes áreas – biotecnologia, genética, longevidade celular – estão abrindo caminhos que prometem não apenas prolongar a vida, mas estender de forma real o período de saúde e vitalidade. A ideia de viver cem anos com qualidade já não é uma ficção futurista: é uma meta que pode ser alcançada em uma década, talvez menos.
Como consultor, comecei a fazer a ponte entre esse universo científico e o mundo dos negócios. Tenho trabalhado com empreendedores e empresas que acreditam que é possível traduzir os resultados da ciência em soluções práticas – protocolos, produtos e serviços capazes de desacelerar o envelhecimento e até reverter parte dos seus efeitos. Isso equivale a reduzir a idade biológica, com impacto direto na saúde e na produtividade.
Essa atuação me colocou no centro de um ecossistema internacional que reúne cientistas, investidores e empresas comprometidas com a construção de um novo paradigma: o da vida centenária como o novo normal. E foi justamente por isso que decidi voltar o olhar para o Brasil. Nosso país está envelhecendo numa velocidade impressionante. Em apenas quatro décadas percorremos o mesmo caminho demográfico que a Europa levou cerca de duzentos anos para trilhar. Esse fenômeno não se explica apenas pelo aumento da expectativa de vida, mas também pela queda vertiginosa da taxa de fertilidade, que hoje já se aproxima dos níveis europeus.
Diante desse cenário, participo do 46 CBPP com o objetivo de sensibilizar o segmento de finanças e previdência privada para a urgência de se preparar para essa nova realidade. A longevidade não é apenas uma pauta social ou de saúde pública e cuidados com gente idosa – é, sobretudo, um tema estratégico de negócios. Empresas de todos os setores precisarão repensar produtos, serviços, modelos de trabalho e relacionamento com produtores e consumidores que viverão cem anos ou mais.
Venho com o objetivo de promover conversas que inspirem e, ao mesmo tempo, apontem caminhos práticos para transformar ciência em estratégia, e envelhecimento em oportunidade de inovação.
A minha provocação final é simples: se a vida humana vai durar 100 anos, o que como devemos transformar a previdência para atender, apoiar e inspirar pessoas que viverão tudo isso? Temos à frente uma nova lógica da vida longa.
*Durante o 46º Congresso Brasileiro de Previdência Privada (CBPP), Ricardo Neves participará como palestrante do painel “Ciência da Longevidade: Implicações para a sociedade e para os fundos de pensão desta nova fronteira do conhecimento”, que será realizado no dia 23 de outubro, das 9h às 9h45.
**Ricardo Neves é consultor de empresas, empreendedores e investidores que desenvolvem negócios relacionados com Tecnologia e Ciências da Vida. Ele é autor de dez livros e o curador do tema Economia da Longevidade na programação da Casa de Inovação Social.
Fonte: Abrapp em Foco, em 16.10.2025.