Por Aparecido Mendes Rocha (*)
Ao receber uma mercadoria a bordo do navio, o armador – transportador marítimo, proprietário ou locatário de navios que realiza o transporte de cargas, é responsável pela emissão do Conhecimento de Embarque (Bill of Lading – BL, em inglês), no qual registra os dados da exportação, como o consignatário, portos de embarque e desembarque e nome da embarcação.
A partir da emissão do BL, o armador se torna responsável juridicamente por eventuais perdas ou avarias sobre as cargas que recebeu para transporte. Pelas leis brasileiras, o transportador marítimo responde pelo valor integral das mercadorias, o que não se aplica os limites impostos pelas convenções e tratados internacionais. Os principais clientes do armador são os agentes de cargas que são responsáveis pela maioria dos fretes negociados. Raramente o armador vende frete direto ao embarcador.
Um dos serviços oferecidos pelos agentes de cargas a seus clientes é o seguro de transporte internacional. A legislação securitária permite que empresas com interesse segurável possa intermediar a venda de seguro de transporte entre seguradora e segurado (importador e exportador), desde que seja por meio de um corretor de seguros. Para prestar esse serviço, o agente de cargas precisa contratar uma apólice coletiva a favor de seus clientes, na condição de “Estipulante do Seguro”. As normas exigíveis para estipular uma apólice estão estabelecidas na Resolução nº 107 do Conselho Nacional de Seguros Privados.
No entanto, o recurso de estipulação de seguro não é extensivo ao armador, pois esse é o sujeito que efetivamente executa o transporte e não tem interesse segurável sobre o bem transportado, o que é uma das exigências para a intermediação da venda de seguro.
Assim, o armador que vende seguro de transporte internacional aos clientes que embarcarem em seus navios, supostamente por possuir uma apólice na condição de Estipulante, comete uma prática ilegal, e está sujeito às penalidades previstas em lei, que ainda podem ser agravadas se ficar comprovado o exercício da profissão de corretor de seguros sem ser habilitado para tal atividade.
O “negócio” do armador é vender frete, e não seguro, portanto, se a intenção é se eximir da responsabilidade por ações regressivas da seguradora contratada irregularmente, por prejuízos causados nas mercadorias que lhes são confiadas para transporte, a prática está equivocada, pois o seguro por estipulação não isentaria o armador de suas obrigações legais.
A seguradora, ao indenizar seu segurado por conta de um sinistro, sub-roga-se, nos limites do valor desembolsado, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano ou responsáveis pelos prejuízos ocorridos – no caso, o armador. A aplicabilidade da sub-rogação de direitos no seguro de transporte tem fundamento no artigo 786 do Código Civil Brasileiro.
(*) Aparecido Mendes Rocha é especialista em seguros internacionais.
Fonte: Blog do Rocha, em 18.07.2016.