Por Mardey Teixeira
A Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) exerce um trabalho louvável de aprimoramento do controle de riscos do mercado securitário, serviço fundamental à consolidação do segmento. Por conseguinte, impõe uma série de medidas técnicas que devem ser adotadas pelas sociedades supervisionadas, dentre elas, as mensurações dos capitais de risco. A autarquia classificou o capital de risco em quatro variáveis: risco de subscrição, risco operacional, risco de crédito e risco de mercado. Neste artigo, trataremos do risco de mercado, especificamente, do quadro estatístico 420 (Fluxos de Direitos e Obrigações Relacionados a Contratos de Seguros).
No ano de 2014, foi publicada a Resolução CNSP nº 317. Esta norma estabeleceu critérios para apuração do capital de risco baseado no risco de mercado das sociedades seguradoras, entidades abertas de previdência complementar, sociedades de capitalização e resseguradores locais. De acordo com a Resolução, podemos entender como risco de mercado a possibilidade de ocorrência de perdas resultantes de flutuações dos mercados financeiros, que causam mudanças na avaliação econômica de ativos e passivos das sociedades supervisionadas. A norma define como capital de risco baseado no risco de mercado (CRmerc) o montante variável de capital que uma sociedade supervisionada deverá manter, a qualquer tempo, para garantir o risco de mercado a que está exposta.
Destaca-se que o CRmerc é uma das variáveis integrantes da fórmula de cálculo do Capital de Risco (CR), este representando o total de recursos necessários para garantir a solvência e a liquidez das sociedades supervisionadas.
Vejam a fórmula:

Consubstanciado pela legislação em epígrafe, o cálculo CRmerc será realizado tendo por base os fluxos de caixa informados nos quadros estatísticos 419 (Fluxos de Ativos Financeiros), 420 (Fluxos de Direitos e Obrigações Relacionados a Contratos de Seguros), 421 (Fluxos de Demais Ativos e Passivos) e, quando aplicável, 422 (Saldos de Excedentes Financeiros). Salienta-se que o quadro estatístico 423 (Detalhamento dos Códigos de Ramos e Planos), apesar de não ser utilizado diretamente no cálculo, conterá informações sobre agrupamentos de ramos e planos que servirão à validação dos dados contidos nos quadros mencionados anteriormente.
Como de praxe, o Manual do FIP desenvolvido pela SUSEP contém todas as informações necessárias para o preenchimento dos quadros citados. É importante se pautar sempre na última versão desse relatório.
Prazos de envio à SUSEP:
Conforme Resolução CNSP nº 317/2015, a exigência efetiva do CRmerc está assim prevista:
- 0% até 30/12/2016 (ou seja, até esta data não será exigida constituição do capital);
- 50% entre 31/12/2016 e 30/12/2017 (exigência de constituição de, pelo menos, metade do valor do capital);
- 100% a partir de 31/12/2017 (exigência integral).
As sociedades supervisionadas deverão, contudo, enviar os quadros 419, 420, 421, 422 e 423 referentes à data-base de junho/2015 até o dia 08/09/2015.
Análise do quadro 420:
Considerando a expertise da MT Atuarial, gostaríamos de tecer alguns comentários sobre o preenchimento do quadro 420, tendo em vista sua relação direta com o cálculo dos fluxos atuariais inerentes aos contratos de seguros e previdência.
Tabela 1 – Quadro 420
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CAMPO
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DESCRIÇÃO
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ESRSEQ
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Número da linha do arquivo.
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ENTCODIGO
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Código da sociedade supervisionada na SUSEP.
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MRFMESANO
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Mês de referência no formato AAAAMMDD, na qual o dia será o último dia do mês.
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QUAID
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Código do quadro - neste caso, 420.
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DOCCODIGO
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Este campo identifica o tipo de direito ou obrigação a que o fluxo se refere (vide tabela CONTRATOSEGUROCODIGO).
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TPFOPERADOR
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Definição do tipo do fluxo. Vide Tabela TIPOFLUXO
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FTRCODIGO
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Este campo identifica o fator de Risco de Mercado ao qual o valor do fluxo é sensível. Vide TABELA FATORCODIGO.
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EMCPRAZOFLUXO
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Prazo em dias úteis entre a data-base e a efetivação financeira.
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EMCVLREXPRISCO
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Valor exposto ao risco, utilizando premissas realistas. O valor exposto ao risco deve ser o valor presente de cada fluxo descontado pela mesma ETTJ utilizada no TAP.
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EMCMULTIPLOFATOR
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Código utilizado quando o registro for referente a direitos e obrigações sujeitos a mais de um fator de risco
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EMCCODGRUPO
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Código utilizado para a identificação de grupos de produtos ou ramos aos quais o fluxo se refere
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Neste quadro serão codificados os fluxos de caixa relativos a todos os direitos e obrigações decorrentes dos contratos e certificados dos planos de seguro, de previdência complementar aberta, de capitalização e de resseguro que o ente supervisionado possua na data-base.
Na estruturação do quadro 420, dois campos merecem especial atenção: DOCCODIGO e EMCVLREXPRISCO.
No campo DOCCODIGO será definido o tipo de direito ou obrigação a que o fluxo se refere. Por esse motivo, a SUSEP desenvolveu a tabela CONTRATOSEGUROCODIGO, que contém os principais diretos e obrigações de uma sociedade supervisionada.
Tabela 2 – Amostra de códigos relativos aos direitos das supervisionadas (Fonte: Tabela CONTRATOSEGUROCODIGO).
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DOCCODIGO
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DESCRIÇÃO
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C0001
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Prêmios e contribuições emitidos a vencer e não recebidos
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C0002
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Prêmios e contribuições emitidos já vencidos pendentes de pagamento
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C0003
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Prêmios e contribuições futuros
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C0004
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Salvados Disponíveis para Venda
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C0005
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Expectativa de Salvados e Ressarcimentos
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C0006
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Prêmios de riscos vigentes, porém não emitidos
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Tabela 3 – Amostra de códigos relativos às obrigações das supervisionadas (Fonte: Tabela CONTRATOSEGUROCODIGO).
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DOCCODIGO
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DESCRIÇÃO
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D0001
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Sinistros ocorridos e ainda não pagos integralmente e benefícios de planos de benefício definido cujo evento gerador já tenha ocorrido
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D0002
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Benefícios de planos de contribuição variável cujo evento gerador já tenha ocorrido
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D0003
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Sinistros a ocorrer e benefícios de planos de benefício definido cujo evento gerador ainda não ocorreu
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D0004
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Benefícios de planos de contribuição definida ou contribuição variável cujo evento gerador ainda não ocorreu
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D0005
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Despesas administrativas relacionadas a riscos assumidos até a data-base
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D0006
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Despesas relacionadas aos sinistros e benefícios
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D0007
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Despesas de comercialização incidentes sobre contribuições e prêmios
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D0008
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Sinistros relativos a vigências futuras
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D0009
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Despesas relativas a vigências futuras
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Como procedimento inicial, a supervisionada deve identificar todos os tipos de obrigações e diretos condizentes com as características de seus planos; e, por conseguinte, relacioná-los com os códigos da tabela CONTRATOSEGUROCODIGO.
Na etapa de definição dos códigos algumas observações são necessárias:
- O código C0001 se reporta ao valor presente realista dos prêmios a vencer. No cálculo do seu respectivo fluxo, devem-se adotar premissas financeiras, estatísticas e atuariais consistentes e passíveis de verificação. O valor corrente será determinado através do desconto do valor estimado pela taxa de juros aplicável.
- O código C0002 se refere aos valores decorridos e pendentes de pagamentos. Os fluxos de recebimento deverão ser estimados considerando critérios e procedimentos consistentes e passíveis de verificação pela SUSEP.
- As despesas D0005 e D0007 devem ser rateadas de acordo com critérios definidos pela sociedade supervisionada. Essas obrigações representam as despesas alocadas diretamente à administração dos contratos em curso.
- Os códigos D0008, D0009 e C0003 somente deverão ser utilizados para os fluxos de contratos em que a renovação das coberturas dependa exclusivamente da vontade do segurado ou participante, seja por cláusula contratual ou por política adotada pela companhia. As estimativas dos fluxos de caixa devem, obrigatoriamente, incluir os prêmios e contribuições futuras; do mesmo modo, as obrigações decorrentes desses prêmios.
No campo EMCVLREXPRISCO, deve-se apresentar o valor do fluxo que pode ser afetado por fatores de risco de mercado específicos. Para cada código DOCCODIGO relacionado pela supervisionada, um fluxo específico deverá ser elaborado. Nos casos de omissão ou má avaliação dos fluxos, e dependendo do seu grau de significância, ocasionar-se-ão distorções consideráveis na mensuração do CRmerc.
Na estimação dos fluxos de caixa de direitos e obrigações relativos a contratos de seguro, previdência, capitalização e resseguro, a supervisionada deverá adotar as mesmas metodologias e premissas utilizadas no Teste de Adequação do Passivo (TAP).
Nos casos de seguro de vida e previdência, os fluxos com pagamentos de sinistros/benefícios, bem como, as receitas com prêmios/contribuições, serão estimadas utilizando a probabilidade de sua ocorrência; destarte, tábuas de mortalidade definidas pela SUSEP devem ser utilizadas.
Para a determinação dos valores econômicos dos fluxos de caixa de obrigações em geral e de direitos relativos a contratos de seguro, previdência, capitalização e resseguro, os valores futuros de pagamentos e recebimentos deverão ser descontados utilizando- se a Estrutura a Termo de Taxas de Juros (ETTJ) estabelecida pela SUSEP para o fator de risco correspondente, a menos que a supervisionada tenha recebido autorização expressa da Autarquia para utilização de ETTJ própria.
Lembramos que o desconto financeiro dos fluxos poderá ser calculado por meio da planilha ETTJ disponibilizada pela própria SUSEP.
Exemplo prático de preenchimento do quadro 420:
Supondo que a seguradora possui apenas 1(um) bilhete de seguro de vida, com vigência anual, capital segurado de R$ 15.000,00 e prêmio único de R$ 90,00 pago no início do período, o quadro 420 é preenchido da seguinte forma:
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ESRSEQ
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000001
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000002
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000003
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ENTCODIGO
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12345
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12345
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12345
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MRFMESANO
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20150630
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20150630
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20150630
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QUAID
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420
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420
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420
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DOCCODIGO
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D0003
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D0005
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C0001
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TPFOPERADOR
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-
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-
|
+
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FTRCODIGO
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JJ1
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JJ1
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JJ1
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EMCPRAZOFLUXO
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00126
|
00126
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00001
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EMCVLREXPRISCO
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46,92
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2,86
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95,23
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EMCMULTIPLOFATOR
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0
|
0
|
0
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EMCCODGRUPO
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000001
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000001
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000001
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Nota: No cálculo dos fluxos e respectivos prazos, considera-se a metodologia adotada no TAP; na identificação dos tipos de obrigações e direitos, observam-se as características do contrato de seguro.
Comentários finais:
O objetivo principal do quadro 420 é a apresentação dos fluxos financeiros relacionados aos direitos e às obrigações das sociedades supervisionadas, decorrentes dos contratos de seguro e previdência expostos aos riscos de mercado. Para a mensuração realista desses riscos, é imprescindível que os fluxos sejam estimados de forma coerente e codificados em consonância com os campos descritos na tabela CONTRATOSEGUROCODIGO.
Por fim, informamos que, em conformidade com a norma vigente, as supervisionadas deverão elaborar um manual metodológico, mantido à disposição da Susep, descrevendo as técnicas, premissas, procedimentos e critérios de materialidade adotados na estimação dos fluxos de caixa.
Mardey Gomes Teixeira é Sócio-Diretor da MT Atuarial. Graduado em Ciências Atuariais pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e Pós-Graduado em Mercado Financeiro e Investimentos pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Atua no segmento atuarial há mais de 14 anos, com ênfase em Previdência Complementar e Sociedades Seguradoras. Primeiro atuário a constituir uma Microsseguradora no Brasil. É membro da Comissão Técnica de Atuária da Abrapp e é Certificado pelo Instituto Brasileiro de Atuária.