“Numa organização, resultados e controles são sinérgicos, um não exclui e nem atrapalha o outro. É como uma motocicleta que, quanto mais velocidade se mostra capaz de desenvolver, exatamente por isso pede melhores freios”, disse Sérgio Rosa, ex-presidente da Previ, na condição de expositor do Painel sobre o tema “Órgãos Estatutários como Guardiões da Governança sob a Ótica do Dever Fiduciário”, ontem, primeiro dia do 3º Encontro Nacional de Governança, promovido pela Abrapp em São Paulo e que se estende até hoje. Ao seu lado na mesa, outro expositor, Waldemir Bargieri, especialista em gestão de riscos e controles internos, completou: os problemas, quando acontecem, não vem em geral nem da lei nem das normas infralegais, com as dificuldades nascendo na maioria das vezes da incapacidade de opor argumentos técnicos às pressões recebidas, falta de qualificação e mesmo de ética.
Momentos antes, o evento, presente perto de uma centena de dirigentes e profissionais de associadas e patrocinado pelo escritório Pagliarini e Morales Advogados Associados, havia sido aberto pelo Secretário de Políticas de Previdência Complementar, Jaime Mariz, no entender de quem “é a governança que garante a solidez do sistema e, portanto, deve ser vista como prioridade”. Ele também chamou a atenção para os avanços normativos proporcionados por decisões recentes do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC), citando especialmente o compartilhamento dos riscos que envolvem a longevidade e a flexibilização das regras que regem a certificação no caso das entidades patrocinadas por empresas privadas e fundos instituídos.
Estados e municípios - Mariz sublinhou a importância da vertente complementar no conjunto da Previdência brasileira, prevendo que essa relevância será cada vez maior, à medida em que os fundos de pensão forem se disseminando pelos estados e municípios brasileiros. “O crescimento da previdência complementar dos servidores é uma prioridade para os próximos 4 anos”, salientou Mariz. Por sua vez, o Diretor da Abrapp, Milton Leobons, responsável na Diretoria pelos trabalhos da Comissão Técnica Nacional de Governança, sublinhou também ao falar na abertura do evento a oportunidade dos temas escolhidos e a qualidade dos expositores reunidos. Já o Presidente do ICSS, Vitor Paulo Camargo Gonçalves, notou que uma das preocupações hoje do Instituto é exatamente o de dialogar com uma maior variedade de atores, no melhor espírito da governança, que é precisamente o de favorecer o equilíbrio de poder. Ele lembrou que nos últimos meses tem se reunido com um maior número de dirigentes.
Renê Sanda, ex-diretor de Investimentos da Previ e atualmente atuando como conselheiro em empresa e no Fundo Garantidor de Créditos (FGC), foi o expositor na Palestra Magna sobre “Governança Corporativa é Questão de Atitude”, tendo começado por chamar a atenção para a importância de as pessoas descobrirem o que as poderia levar às melhores práticas e quais os objetivos ocultos a reconhecer e administrar no caso. Em seguida, observou que, melhor do que contratar um consultor para abrir o caminho à governança em sua entidade, seria o dirigente visitar uma outra EFPC bem avaliada que possa relatar como chegou a isso, estudar as práticas recomendadas pelos especialistas e apostar alto na transparência.
Quanto ao que deve orientar a escolha de gestores de recursos, recomendou que se defina os critérios a serem seguidos antes de mais nada, coloque o foco no resultado líquido e não no tamanho da taxa de administração, prepare o regulamento para eventuais cenários de estresse e “não comece do zero, não debata outra vez problemas que já foram exaustivamente debatidos”.
Motocicleta - No painel em que apresentou uma motocicleta de corrida como exemplo de que a velocidade deve ser acompanhada de bons freios, Sérgio Rosa explicou porque pensa assim, isto é, numa organização não podem faltar nem quem faça a máquina avançar nem aqueles que zelam para que esse avanço aconteça dentro dos trilhos das boas práticas, que podem evitar um eventual acidente. Sérgio criticou os que entendem existir entraves burocráticos em toda tentativa de fazer o processo caminhar dentro dos controles recomendados, queixando-se de que a sua liberdade está sendo tolhida.
Para Sérgio, os fundos de pensão deveriam, a exemplo das empresas de capital aberto que tomam concorrentes como referência, tentar se beneficiar ao se comparar com outras entidades.
Ele também notou que a legislação brasileira que rege a governança de fato fornece o arcabouço básico, mas está longe de esgotar os problemas, mesmo porque dos detalhes cuidam as pessoas e não as leis ou normas.
Afirmou que a seu ver os órgãos colegiados das entidades são de natureza administrativa, quer dizer, não existem para representar a empresa que indicou conselheiros nem os participantes que os elegeram. No seu entendimento, está claro que o integrante do Conselho ocupa tal assento para tomar decisões que favoreçam o coletivo e não o seu grupo em particular. “O conselheiro é o único responsável pelas posições que toma, não podendo jogar depois a sua responsabilidade sobre os ombros da patrocinadora ou do trabalhador”, acrescentou.
Apontou também a governança como o melhor “antídoto” que o conselheiro ou dirigente têm a mão para defender-se de quem os pressiona, na medida em que podem argumentar que o procedimento tal precisa ser seguido, independentemente de sua vontade.
No mesmo painel, Waldemir Bargieri notou que para que tudo funcione corretamente é preciso investir em controle, transparência e participação dos trabalhadores e dos assistidos. Reconheceu que a supervisão conduzida pela Previc tem uma importância grande nisso tudo.
José Ricardo Sasseron, Vice-presidente da Anapar, encerrou o painel dizendo que a base legal e normativa precisa mudar pelo menos em um ponto, aquele que traça os procedimentos que envolvem alterações nos planos. Lembrou que não apenas os participantes têm interesses, uma vez que as empresas patrocinadoras também os têm. “Ética é obrigação, bem como a transparência”, concluiu Sasseron.
Base forte - Pairando acima do evento, a Resolução CGPC 13, de 2004, foi reconhecida não apenas como o primeiro passo mais efetivo na construção da governança como uma construção sólida que beneficia o sistema, como algo que permanece, próxima de completar 11 anos de vigência, cumprindo adequadamente o papel para o qual foi criada. “É uma base muito forte”, resume Adriana de Carvalho Vieira, Coordenadora da Comissão Técnica Nacional de Governança.
Fonte: Diário dos Fundos de Pensão, 23.06.2015.